sexta-feira, 28 de dezembro de 2012


                                         O ANO ENVELHECEU
Crônica de Pedro Salgueiro, para O povo.
O ano envelheceu cedo, senhores, eventos de toda sorte foram apodrecendo suas vísceras, minando seus frágeis alicerces.
A cidade envelheceu de política e futebol, viveu mais de bastidores que de cenas, envelheceu nas sombras, construiu em silêncio suas podres carnificinas.
O país envelheceu devagarinho, com tanta lama à direita e à esquerda do surrado caminho.
Envelhecemos todos, estupefatos com o fim esperado, longamente anunciado, engendrados em seus vis maquinários.
Apodreci eu, por dentro e por fora; cada tripa escondida no mais recôndito lugar: esconderijos de todas as vergonhas minhas e dos outros, todos.
Apodreceram os inimigos fartos em maldades e covardias. Apodreceram todos, como as demais coisas esquecidas nos armários mais esquecidos.
Apodreceram os poetas engalfinhados com as lutas mais vãs, mais comezinhas e fúteis, como brigas de casais que nem sabem mais por que brigam essa briga em comum, mal sabendo que são o fazem é o que lhes restam, como restos de peixes apodrecendo nas coxias de uma calçada do subúrbio mais distante.
Apodreceram todos os domingos, as segundas, as terças e quartas, as quintas e os poetas de quinta, apodreceram as sextas, mas ainda restam luminosos (até quando?) os sábados.
Apodreceram os ladrões, engravatados ou não, os donos de bares mal humorados pelo eterno fel que nos servem impunes.
Apodreceram todos, enfim, desta infame loirinha desmiolada pelo sol. Apodreceram os daqui e os que vieram do interior. Apodreceram de sol e de sal.
Apodreceram, principalmente, os que se encharcaram de perfume, de roupas caras, de livros raros, de desculpas esfarrapadas...
Apodrecemos nós. Os simples mortais deste lado de cá das mil e uma Aldeotas, dos seus vis e servis clubinhos.
Apodrecemos e escorremos sem fins pelos buracos dos trens subterrâneos que nossa insana arrogância cava há séculos. Que nossa burguesiazinha sonsa cava há séculos, que nosso escroto povinho cava há séculos...
Pois o ano envelheceu, senhores, e apodrecemos todos na espera deste outro que bem já nos diz a que vem!
O ano apodreceu, senhores...



                                        
        
         DA CONTENÇÃO


Em mim sempre houve
a inquietação do ponteiro dos segundos

Tudo me vem com interjeições
E eu vivendo só de murmúrios!
Oh se eu soubesse escrever
todas as interjeições por que passo,
Se eu pudesse dizer cada pulsão que há na minha vida,
Ah se eu soubesse!

Tantos ohs por viver, meu deus,
E eu nessas economias,
Nesses tristes psius a que me submeto ...

Carlos Nóbrega

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

                                   
                                 
                                      CONFRATERNIZAÇÃO NATALINA

Os Poetas de Quinta e o Abraço Literário realizaram nos dias 15 e 16, respectivamente, a confraternização natalina no sítio do Bernivaldo Carneiro - Eusébio. Agradecemos a repetida gentileza com que somos recebidos pelo Bernivaldo Carneiro e sua esposa Anastácia.

Nos dois dias de confraternização dos grupos foi realizado o amigo secreto de livros, inauguração do Salão (de sinuca) Pedro Salgueiro, maratona literária do Abraço Literário, dinâmicas entre os abracistas, muita sanfona, triângulo e zabumba em homenagem a Luis Gonzaga.  

Outra vez os Poetas de Quinta e o Abraço Literário agradecem aos anfitriões por nos receber em um sítio tão hospitaleiro.  


                     CONFRATERNIZAÇÃO NATALINA DO ABRAÇO LITERÁRIO
                                                         16/12/2012
                                                    Carlos Vazconcelos

Yuri Falcão. Muita ressaca.

Inês Ramalho
Rogério, declamando.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Confraternização natalina dos Poetas de Quinta - sítio do Bernivaldo Carneiro

Inauguração do Salão (de sinuca) Pedro Salgueiro
Momento do Amigo secreto. Heloise, filha do Roberto Vazconcelos
Carlos Vazconcelos
                                Raymundo Netto com Ana Júlia, filha do Salgueiro
                            Tércia Montenegro, recebendo livro do Amigo secreto

                                                   Silas Falcão e Yuri Falcão

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012


                                                                   SEGREDOS

Pedro Salgueiro para O Povo

“O que se diz é que o desejo atual das pessoas de se mostrar, de se exibir, de que sua vida tenha testemunhas (o exemplo citado é o das pessoas que penduram sua vida na internet), talvez seja o resultado de uma nostalgia da velha idéia de que Deus era testemunha de tudo que fazíamos, de nossa vida inteira.”
(Javier Marías, entrevista aO GLOBO)

Numa das poucas pistas que deu para o fato de ter deixado de escrever (ou pelo menos de publicar), Raduan Nassar disse, em rara declaração, que o escritor é como aquele menino que os pais colocam na sala diante das visitas para se mostrar: recitar versos, cantar de cor uma canção, fazer “de cabeça” operações matemáticas, tocar algum instrumento musical ou simplesmente dizer gaiatices.
Sempre me intrigou o motivo que leva alguém a transpor para o papel (hoje a tela) seus segredos mais bem guardados, suas taras mais secretas, seus instintos menos públicos. Deixa-me de cabelo arrepiado (o pouco que tenho) a perspectiva de que um estranho me desvende atrás do novelo de uma frase. Que do emaranhado de palavras brote, para um atento leitor, o monstro que sou (somos todos nós!?) na intimidade do coração.
Assusta-me a necessidade desenfreada que as pessoas têm (temos) de se expor, de se “amostrar”, de se desvendar inteira para essa multidão de estranhos que as (nos) rodeiam. E essa carência de reconhecimento, de não serem anônimos no mundo, (ou sempre foi assim, hoje apenas é mais visível?) se tornou doentia.
O exibicionismo impera na internet e fora dela. Facilmente sabemos quase tudo da vida de qualquer um: não só de seu corpo, tatuagens e manchas, mas até nuanças emocionais. Fotos e confissões disputam espaços nos blogs e sites. Fala-se publicamente de finanças e sexo, de trabalho e viagens, de projetos e sonhos. Nós — sem que nenhum governo tirano, nenhum sistema político sofisticado, nos obrigue — nos colocamos numa bandeja prontos para ser servidos.
Quisesse saber de segredos, antes: necessitava o marido suspeitoso contratar detetive para seguir a esposa (ou o contrário, claro), a empresa enviar funcionário à vizinhança do futuro empregado. Serviços secretos, de espionagem doméstica ou empresarial, público ou privado, proliferavam em várias escalas da sociedade.
Hoje não, bastam alguns minutos na frente do computador e já sabemos o signo, as preferências culinárias, a ideologia política ou religiosa, as taras e fetiches e até (pasmem!) projetos de vidas e sonhos de qualquer pessoa, seja ela uma simples doméstica ou um pedante professor universitário.
Claro, não colocamos todas as verdades, pois muitas vezes nem mesmo nós as sabemos. Deixamos apenas pistas. Fotos e pegadas que jamais (me fala um amigo fanático pela “grande rede”) poderão ser apagadas.
Se formos baixos, ficamos altos; se pobre, ricos; se desinformados, copiamos citações no Google.
Criamos nossos próprios “fakes”. E saímos (pior, nem mais saímos) por aí completa ou parcialmente Frankensteins.
Resta-nos somente, na nossa incontrolável ânsia de exposição, saber quem vai nos inventariar no futuro.
Quem vai comer esse prato quente que hora servimos a todos?


segunda-feira, 3 de dezembro de 2012


                                                           CESSI
Por Silas Falcão
Encontro Cessi balançando seus poucos pensamentos. “Cessi, como vai a senhora?” De dentro da rede os seus olhos antigos e magros me contemplam com tristeza: “Vou aqui sofrendo este resto de vida, meu filho”
Afetei carinhos a Madrinha Cessi, festejando os conselhos que ela me deu quando eu era menino.


A TELA VIVA DO GEÓLOGO

Por Arleni Portelada

Tenho a alegria de pertencer a ALMECE, poder usufruir de um convívio nobre onde floram poetas, músicos, escritores, mestres em seus dons. Cada um no seu particular universo tem luz estelar e a latente capacidade de surpreender seus semelhantes, pelas extraordinárias performances de talento e de sensibilidade. Uma dessas cenas aconteceu na apresentação da IX Coletânea da Academia de Letras dos municípios do Estado do Ceará, como brinde aos 29 anos da entidade (setembro de 2011). Protagonizada pelo acadêmico Bernivaldo Carneiro, a peça de oratória comoveu, não apenas pela beleza literária e interpretativa (partindo dele isso é normal). A exposição ultrapassou a oralidade e ganhou valores sensoriais intuitivos, na fusão com outra arte: A pintura. A citação dos autores, foram pinceladas num buquê multi floral, finalizando as nuances nos tons da ternura e regando cada pétala com uma gota de carinho. O geólogo, ambientalista Bernivaldo Carneiro, transformou um livro de vários autores numa belíssima tela viva, uma composição de textos/flores louvando a cultura, a primavera e a ALMECE, que tanto amamos.


                                                O som que rola

Carlos Nóbrega

                         O ruído metálico de uma porta de enrolar
abrindo-se na vendinha:
é tão manhã.
É tão rigorosamente manhã
na alma grossa do velho bodegueiro
o subir estrepitoso desta placa ondulada ...

Mercadorias humildes amanhecem nubladas
e o primeiro freguês, que não compra nada,
sai com o seu bigode de antigamente
ouvindo da gaiola pendurada
o canto desesperançado de uma avezinha
a se debater no impossível voo ...

Ai a grande poesia desamparada das lojas falidas!