segunda-feira, 31 de março de 2014


PRÊMIO (NACIONAL) SESC DE LITERATURA - RESULTADO



Débora Ferraz e Alexandre Marques são os vencedores do Prêmio Sesc de Literatura 2013. 

Enquanto Deus Não Está Olhando, romance da jornalista Débora Ferraz e O Parafiliasuma, livro de contos de Alexandre Marques, foram os vencedores do Premio SESC de Literatura – 2013.

O meu livro de contos, O colecionador de dedos, ficou entre os 10 finalistas. Fico muito contente por esta classificação.


Silas Falcão




 Devaneios, Delírios e Desamores

Devaneios, Delírios e Desamores. Romance escrito por Bernivaldo Carneiro com 36 capítulos, 382 páginas deliberando a mente numa ficção, sem desligar-se de fatos reais do cotidiano. Sim, quando escrevemos, a mente recria situações nunca impossíveis da vida prática e costumes adquiridos no recôndito sutil da sociedade em que vivemos.
Nos primeiros capítulos, o sentimento de ser pai projetou seu coração, no futuro promissor do filho, imaginando a profissão sem deixar de falar do hábil garoto inteligente, interativo, travesso, hiperativo e poder de decisão diante de fatos inesperados e respostas prontas no momento exato. Sem omitir as conquistas amorosas desde cedo.
Bernivaldo firmou consigo mesmo o compromisso de escrever esta obra. Há um apanhado largo de leituras. Vemos, quando cita diversos autores, faz comparações, estabelece credito de escritor atento e disposto a informar o leitor nas suas andanças criativas.
O pensamento viaja em situações diversas, basta olhar e deitar na perplexidade dos fatos. Inicia um capítulo com ousadia e termina com ousada maestria.
O pano de fundo do romance, porém, se deleita com os delírios de amor, das filhas do senhor Felicíssimo. Pai conservador impondo em pleno modernismo, que se conservem pudicas até o casamento para não manchar a honra da família, árvore genealógica de longa data.
Pobres filhas que se deram ao luxo e prazer de fazer da vida mundana o despontar da vida diária. Bonitas, sensuais e infiéis usavam e abusavam da lascívia para satisfazer os desejos e afrontar o pai, encoberto de desgosto e vergonha.
A infidelidade aos “maridos” virou rotina. Saber de quem era um filho só na sorte da aparência quando nascia. Uma delas, de tanto maltratar o marido provocando a morte decidiu ser irmã de caridade, mas não vingou... Vários episódios tomam espaço nos capítulos, entra devassidão, prazeres e sensualidade, dos personagens...
Bernivaldo Carneiro tem estilo pessoal, talento engenhoso. A letra corre fácil nos seus devaneios, o vocabulário ora simples, ora de alta projeção vai se mesclando sem se perder na compreensão dos fatos.
Não opto por comparar autores e sim apresentar o essencial da obra, deixando a certeza que cada escritor é único, com estilo especial e cada criação revela o “eu essência” do escritor.


Sonia Nogueira, (escritora de contos, crônicas e poesias)



segunda-feira, 24 de março de 2014




Nilto Maciel:

40 anos de literatura, quase 70 de vida.


Crõnica de Pedro Salgueiro, Jornal O Povo – 22-03-14.

Nilto Maciel é o escritor cearense mais dedicado à literatura que eu conheço: convive com ela – intimamente – 24 horas por dia (e digo isso porque mesmo à noite, enquanto dorme, ele continua produzindo fiapos de enredos que passará para o papel na manhã seguinte, ou quando desperta assustado pelo sonho – ou pesadelo – em plena madrugada).
Dedicou sua vida inteira aos livros, passou de leitor voraz a escrevinhador de sua própria obra ainda muito jovem, mas sempre deixando tempo para a editoração e divulgação de outros escritores, seja através de antologias, revistas literárias e, mais recentemente, sites e blogs na internet. Foi co-editor da revista O Saco ainda na década de 1970, mais recentemente capitaneou (heroicamente e por quase duas décadas) a revista Literatura e, atualmente, se dedica ao seu movimentado blog http: literaturasemfronteiras.blogspot.com.br. Sua cabeça criativa, inquieta, trabalha, pois, incessantemente, até mesmo enquanto se alimenta, conversa ao telefone, assiste à televisão (vários de seus contos tiveram origem em acontecimentos banais vistos em noticiários, ouvidos em diálogos de filmes assistidos pela metade altas horas da noite, até em anúncios e propagandas).
Produziu romances, poemas, crônicas, críticas literárias, diários, memórias etc., mas foi ao gênero conto que ele dedicou mais tempo, força e talento. Ninguém escreveu mais histórias curtas do que ele aqui no Ceará. Já ultrapassa as 300 narrativas, todas com qualidades comprovadas, como atestam os inúmeros prêmios e a vasta fortuna crítica.

Em breve lançará (pela editora cearense Armazém da Cultura) A fina areia das dunas, que é seu décimo livro de contos, feito somente alcançado, em nossa terra, por Eduardo Campos e Caio Porfírio Carneiro. Nesta nova coletânea a unidade não se encontra na temática (que é bem variada), nem no enfoque narrativo (inquieto que é, troca de posição a todo instante: às vezes demonstra a onisciência de um manipulador de marionetes, noutras desce quase à posição insegura de leitor comum), mas numa constante ironia, que anda de mãos dadas com uma insólita visão do mundo (pois, mesmo em seus contos mais realistas, ele sempre nos acena com sugestões fantásticas, muitas vezes surreais).

***

E neste ano de 2014 – às vésperas de completar seus 70 anos de vida – faz exatos 40 anos da estreia, com o livro de contos Itinerário, de Nilto Maciel na literatura. Mas o longo tempo de ofício, as dificuldades de publicação pelas quais passam escritores novos e veteranos, a escassez de leitores, enfim, a falta de estímulos em geral para um escritor continuar produzindo não o fizeram desanimar: continua firme e forte publicando um livro atrás do outro, e são raros os dias em que não tenha uma boa ideia para um conto, crônica, poema ou mesmo romance novos.

Desejo – desejamos, nós seus leitores, companheiros de letras e amigos – muitos anos de vida e, principalmente, muitos e muitos outros livros; que você continue a nos brindar com seu talento literário e com seu exemplo de perseverança, dedicação e ousadia.


terça-feira, 18 de março de 2014






O romancista Carlos Vazconcelos


Por Batista de Lima
Caderno 3, Diário do Nordeste

O leitor de romance precisa ser consciente de que o fôlego para escrever uma história longa necessita encontrar parelha na sua leitura. O que acontece nos tempos atuais é a preferência pelo conto. A história curta é mais adaptável ao corre-corre desta modernidade exaurida. É coragem, pois, o cultivo do romance. E isso não falta em Carlos Vazconcelos, com z. Meter-se numa cela de prisioneiro e escrever cem páginas sobre os dramas e as angústias de um preso inocente, tem tudo para ser uma narrativa modorrenta e cansativa, mas não é. Ele trabalha com abismos que estão muito abaixo do piso da cela, e muito acima do teto da prisão.

Vazconcelos suscita reflexões sobre o nosso sistema prisional, sobre os meandros das operações da justiça e sobre o comportamento dos operadores do Direito. Não é necessário atribuir-lhe intertextualidades. Ele conhece bem as formas de vigiar e punir dos dias de hoje, dos nossos calabouços. Como conseguiu tanto conhecimento, não importa. O que interessa é que as entranhas da prisão são mostradas através de uma narrativa em primeira pessoa, de forma tão crua que a impressão que se tem é de que o autor-personagem estagiou como prisioneiro, por quinze anos para escrever tão bem sua saga. Já que a única prisão que Carlos Vazconcelos tem curtido por toda a sua vida tem sido o labirinto estrutural da frase, pressupõe-se ser essa obra um trabalho de demorada pesquisa.

Como leitor, tive que me aprisionar em sua companhia numa dessas delegacias de nossa cidade, para conhecer o intestino putrefato das nossas casas de detenção. Por isso que, mesmo ficção, seu livro é uma denúncia. A primeira morte que o personagem enfrenta é ver seu amor se lançar do alto do edifício. Águida ao se jogar para a morte, não foi sozinha. Levou seu amor, levou seu autor e levou seu leitor. A fala de Águida foi de tripla fatalidade e vai reverberar em cada um que ler esse livro. A segunda morte do personagem-narrador foi sua condenação, sendo inocente, foi a perda de uma liberdade que já não tinha.

Outras mortes podem ainda lhe serem atribuídas como a perda do nome. Ele vira um número. Ninguém o conhece pelo verdadeiro nome em nenhum momento do livro, porque seu nome é o do autor, é o meu, é o de Águida é de quem se meter a ler a história. A última morte do personagem é ter que estar vivo e solto sem se livrar de si próprio. Ao final, verifica-se que a única liberdade alcançada é a de Águida ao voar do mais alto do edifício. Nós outros estamos acorrentados, sem conseguirmos nos libertar de nós próprios e dos outros. Pronto. Poder-se-ia parar por aqui a análise desse livro. Acontece que outras falas gritam de suas páginas, pedindo vênia para serem apresentadas.

Uma dessas falas segundas é o determinismo que margeia a narrativa, colocando seus personagens numa situação sem escapatória. Até o Deputado, crápula condenador do inocente e pai da suicida, termina com sua punição, ao sofrer terrível acidente na estrada, em noite de chuva. Até o bom moço, irmão do personagem principal, morre, que é para não escapar ninguém, nem anjos nem demônios. É, pois, um texto marcado pela densidade dos grandes romances clássicos. Carlos Vazconcelos desce aos porões das prisões para chegar aos porões da criatura humana nos seus momentos extremados. Narra porque conhece os limites da natureza humana.

Esse título "Os dias roubados" poderia ser "O processo", ou "Metamorfose", ou "Angústia", ou "Memórias do Cárcere". Qualquer que fosse seria um conjunto de "Revelações", de um Febrônio Índio do Brasil, do século XXI, nesse caso, vítima de um erro judiciário. Afinal, deixar o covil em que permanecera quinze anos e ser colocado na rua não significa liberdade. Ele continua carregando nas costas aquela masmorra travestida da impossibilidade de reencontrar a vida que lhe foi tirada. Esse drama é bem urdido pelo autor, numa tescitura de quem é familiarizado nas lídes das letras. Como licenciado em Letras, pela Universidade Federal do Ceará, Vazconcelos tem credencial de sobra para navegar nessas águas.

A Expressão Gráfica e Editora marcou positivamente o ano de 2013 em editar essa obra, que precisa ultrapassar os muros desta província e se mostrar também lá fora. Essa ficção está comprometida com a realidade. Os "Relatos da Sombra", manuscritos supostamente deixados na cela por um prisioneiro falecido, é genial invenção do autor, para tomar como ponto de partida para sua narrativa. É também uma suposição de que muitos escritos, na verdade, podem ter se perdido em circunstâncias similares. Até nessa escolha, o autor foi inventivo, deixando sempre transparecer seu lado denuncista ao tratar de um tema tão crucial nos dias de hoje que é o sistema prisional decadente do nosso Brasil.

"Os dias roubados" é uma narrativa que põe o leitor para refletir. Leva a uma reflexão que extrapola o arcabouço correcional das prisões e vai para as ruas, para uma análise daquelas criaturas que, tendo estado reclusas, são postas no seio da sociedade, após a libertação. Afinal, se nossas prisões são escolas de crimes, o ex-preso necessitaria de acompanhamento após a conquista da liberdade. Se ele não saiu mais criminoso após cumprir a pena, sai destruído psicologicamente, sem condições de assumir a nova vida. Esse é o caso do personagem narrador do livro. Mesmo estando livre, os traumas do aprisionamento não o deixam mais. Por isso que esse livro de Carlos Vazconcelos se torna um alerta para autoridades da justiça pois nossas prisões roubam os dias que restam a prisioneiros ou libertados.







Viajantes e sedentários


Eduardo Montes-Bradley, um cineasta argentino morando nos Estados Unidos, comentou que os escritores brasileiros parecem com as bandas de rock, não param de viajar. É verdade. Penso que está desaparecendo o narrador sedentário, o cara que ficava na sua oficina, ou dentro de casa, remoendo as histórias que ouvira, pensando, emendando pedaços de outras narrativas para recontá-las ao seu modo. Agora só existem viajantes, segundo a classificação de Walter Benjamin. Até eu, o sedentário mais radical, me tornei um andarilho. Acho que foi praga ou feitiço.

Vez por outra encontro autores cearenses nas viagens literárias. Em Frankfurt, embora não estivesse na comitiva oficial, Tércia Montenegro marcou presença. Soube recentemente pelo ministro da embaixada brasileira na França, Alex Giacomelli, que Tércia estará no Salão do Livro de Paris, ao lado de dois pernambucanos. Uma força do nordeste, se consideramos que foram convidados apenas cinco representantes do Brasil.

Outra que tem sebo nas canelas é Socorro Acioli. Anda pra peste essa danadinha. Conheci-a num bar de hotel, na cidade de Bogotá, durante a Feira de Livros de 2012, quando o Brasil era o país homenageado. Isso está parecendo música brega. Não pensem mal da escritora, ela tomava chá aromático com frutas, uma pedida que eu e minha esposa copiamos. No retorno da Colômbia, de passagem por Fortaleza, jantamos na casa de Socorro e seguimos para Manaus. Outra feira. Meu Deus, quanta rodagem! Foi praga, mesmo. Preciso tirar esse ebó.

Mas a pioneira de nossa literatura feminina cearense atual, a abre-alas, o nome mais festejado (sem citar Raquel de Queiroz e Natércia Campos, porque as duas já se encantaram; Natércia cedo, quando escrevia sua melhor prosa) é Ana Miranda. As outras seguem o caminho e prometem.

E não existem escritores viajantes homens, no Ceará? Tem gente com a língua coçando pra fazer a pergunta. Calma, existem! Falo de andarilhos que moram em Fortaleza, ou que voltaram a morar como Ana Miranda. Samuel León, editor da Iluminuras, valoriza os que “não sentam” sobre os livros que publicam, e ganham o mundo divulgando, vendendo, fazendo a defesa e a apologia do que escreveram. São os “banda de rock”, um evento do mercado e da expansão da nova literatura brasileira, entre os quais me incluo com Tércia e Socorro.

Uma das melhores prosas poéticas que conheço tem a assinatura de Inez Figueiredo, cearense de Fortaleza. Ela parece ter escolhido o exílio dentro da poesia e de sua própria casa. Nunca consegui encontrá-la, além dos seus livros. Já escrevi antes que o prazeroso ou atormentado exercício da escrita tem pouco a ver com o giro pelo mundo, à cata de leitores. Pouco a ver com a caça aos prêmios. Muitos preferem se erguer às alturas sem desejos e encher de silêncio o coração. É possível que também Inez.

E os viajantes homens? Estou na lista mal afamada. Alguns dos que possuem mais quilometragem nasceram no cariri, espaço de nosso mapa que sempre sonhou ser um estado autônomo, no entorno da serra do Araripe formado por Piauí, Pernambuco e Ceará. Somos desgarrados, arribados para o Recife e depois pra mais longe. Xico Sá – jornalista, cronista e agora romancista, também homem de televisão, é um recifense confesso, apesar de morar em São Paulo. Sidney Rocha é outro que adotou o Capibaribe e o Beberibe. Por esses dias publicará uma série de romances prodigiosos, na trilha de outros livros de sucesso. Everardo Norões escolheu a poesia, o Recife, a Argélia e Moçambique. Voltou a morar no Recife e acaba de estrear no conto. É mais um exilado.

Seria injusto esquecer Pedro Salgueiro, que primeiro saiu em busca do mundo, no pau-de-arara de uma nova geração cearense. Quando as editoras do sudeste pareciam inacessíveis aos narradores das bandas de cá, ele furou uma edição na Topbooks. Num rasgo de generosidade, tentou nos carregar junto. Pedro talvez seja nosso viajante da virada do milênio (não menciono Ana Miranda, sempre no panteão mais alto). Eu só emplaquei meu primeiro livro na Cosacnaify, em 2003. E a partir daí, o redemunho me carregou pelos pés.

Na última vez em que nos falamos, Pedro Salgueiro confessou certo cansaço, um gosto em se balançar na rede da província e assistir partidas de futebol na televisão. Até compreendo, pois de vez em quando também penso em retomar o plantio de café. Sério. Fazer literatura tornou-se uma coisa muito enfadonha. Dá vontade de sentar na ruma de livros, sem ligar pra o que diz Samuel León. Que dá vontade dá mesmo! Até que surge um novo convite.

Ronaldo Correia de Brito


segunda-feira, 17 de março de 2014


Prezados amigos,

há uma nova resenha de livro de Economia & Sociedade no portal Neoresenhas:

Patrice Lumumba, Africa´s Lost Leader, do pesquisador inglês Leo Zeilig.


Como essa resenha tem a ver com um assunto que interessa a um de nós, o nosso amigo Casqueiro, tomo a liberdade de enviá-la abaixo:

Um homem quis construir um Estado

ZEILIG, Leo. Patrice Lumumba: Africa´s Lost Leader. London: Haus Publishing. 2008. 182p.

Impressionam nele as ausências. Não possuía os atributos de outros líderes do Terceiro Mundo na mesma época: faltava-lhe a proeminência intelectual de Kwame N´Krumah, as décadas de monasticismo clandestino de Ho Chi Minh ou a construção organizativa de Gamal Abdel Nasser. Malgrado isso, tornou-se o mais célebre líder da África, ao lado de Mandela.

O jornalista inglês Leo Zeilig traça um painel geral da vida de Isaie Tasumbu Tavosa, que depois adotaria o nome de Patrice Lumumba (1925-1961) e que sob esse nome liderou para a independência um país conhecido hoje como República Democrática do Congo.

A Bélgica colonizou a maior parte da bacia do grande rio Congo (também conhecido como Zaire). Fez nela também um dos maiores genocídios da história, oprimindo a população para obter borracha e marfim quase de graça. Isso ocorreu na virada dos séculos XIX a XX. Lumumba não viu isso. Também por muito tempo não foi informado disso: a Bélica tinha uma zelosa política de não permitir a educação na sua colônia, de forma que, quando da independência em 1960, o Congo possuía menos de trinta pessoas formadas, das quais apenas um advogado.

Diante de tão poucas oportunidades o jovem Lumumba compensou a falta de escolas lendo por conta própria, aperfeiçoou o francês com um curso por correspondência. E se tornou pequeno funcionário dos correios, o que, para a colônia, não era pouca coisa. O autor argumenta serem risíveis as acusações de comunismo: em 1958 não haveria um só livro de Marx em todo o país.

Impressiona sua falta de preparo teórico. E prático. Lumumba não escreveu pequenas bibliotecas de ensaios políticos, nem gastou anos em reuniões de comitês subversivos. Ao contrário, faltando cinco anos para a independência ainda escrevia artigos sobre a obra civilizadora dos belgas. Presidiu sua primeira associação mais ou menos na mesma época. E nem era exatamente uma organização política. Só se tornou político de tempo integral três anos antes de se tornar primeiro-ministro.

As bombas atômicas jogadas no Japão foram feitas com urânio do Congo vendido barato pelos belgas. Aos Estados Unidos interessava pouco que essa fonte parasse na mão da União Soviética, apesar da quase nenhuma afinidade de Lumumba com aquele regime.

Talvez por isso foram as províncias que continham minerais as que declararam movimentos separatistas com semanas da independência. As Nações Unidas pouco fizeram, os países africanos menos ainda. Apoiados pela Bélgica, os rivais de Lumumba o mataram e instauraram um regime de corrupção que atirou um país rico em minério e energia elétrica na pobreza.

A obra traça o retrato de um homem tentando surfar um vagalhão fora de seu controle - a transição da dominação europeia direta para uma independência comportada. O colonialismo tudo fez para inviabilizar um Estado unificado e apto a usar as riquezas nacionais em benefício de seu povo. Era o sonho de Patrice Lumumba. Continua a ser um sonho africano, e são muitos os que trabalham para que se torne real.


Abraços,

Paulo Avelino 


sábado, 8 de março de 2014

No Carnaval
 Pedro Salgueiro, jornal O Povo

Quando você foi embora...

Nem bem deu sexta-feira e a Luzanira sumiu, mas só notaram sua falta à hora de dormir – a rede estirada no canto da sala permanecia murcha –, aí foi um procura aqui e acolá dos diabos. Todos os recantos da casa e do quintal minuciosamente vasculhados, a rua inteira – de porta em porta – acordada, causando um frenesi apenas abafado pelo som dos blocos que passavam vez por outra na rua de trás. (Lourival, então, era o mais nervoso.)

...Meu coração quase parou.

Pela madrugada os vizinhos iam se recolhendo, cada um tinha uma versão do sumiço; e somente os de casa não pregaram olhos naquela noite; continuaram a ouvir o barulho dos blocos até de manhã, quando então abriram as portas e foram novamente bater à casa dos vizinhos. (E, pra variar, recorreu à fiel companheira de sempre.)

Foi somente tristeza que você me deixou...

Já passava do meio-dia quando tomaram a decisão de denunciar o caso à polícia; deram parte, responderam às perguntas do escrivão. Prometeram investigar com a ajuda de um retratinho. A família dividiu-se em meio a um pequeno bate-boca: uns resolveram voltar para casa lamentando o ocorrido, outros partiram para os hospitais; a irmã caçula – a mais sonhadora – decidiu ir à rádio, para divulgar a notícia entre um samba e outro. Cansados, somente à noitinha tiveram coragem de procurar no necrotério, onde a busca do corpo entre os dos indigentes foi inútil. (Zonzo, suado e frio, via a todos como imensas mariposas em volta da lâmpada.)

Não tem jeito que dê jeito...

Os cinco dias de transtorno foram enfrentados a calmante e chá de cidreira, além do apoio constante da vizinhança. (E ele lá, resistindo, entre a peixeira e a saudade.)

Pra você viver comigo.

E sequer amanheceu a quinta-feira, lá estava a Luzanira ao pé da porta. O rosto baixo buscava os pés de quem se aproximasse, a roupa e o cabelo brancos de maisena – apenas balançava a cabeça de baixo para cima, ou de um lado para o outro, conforme fosse a pergunta. (Às vezes, as lágrimas vencendo a raiva.)

De hoje em diante, nós vamos ser dois simples amigos.

(*) Temática do texto e frases em itálico retiradas da canção “Não tem jeito que dê jeito”, do mega-pop-star maranhense (de Timon) Raimundo Soldado, recém falecido, legítimo representante da nossa Música Popular Romântica (MPR).
(**) Conto publicado originalmente na coletânea de contos bregas Assim você me mata – Organização de Cláudia Brites


quarta-feira, 5 de março de 2014


POETAS DE QUINTA
CARNAVAL 2014

Olha aí a Nana Pajeú, invenção do Bernivaldo Carneiro e Anastácio. Silas Falcão assinou a ideia criativa.
        Carlos Vazconcelos
                                                                        Bernivaldo Carneiro

Paiva, editor da revista Cruviana e sua esposa com Pedro Salgueiro e sua esposa Ana, em Fortim.