sábado, 30 de março de 2013



                                                      A REDE
Os pescadores retiraram a rede pesada de peixes. Mas hoje, eles não sabem por que a mesma rede, sem peixes e livre, não sai do rio.

Silas Falcão
                                        

                                     O PLAGIÁRIO


Carlos Nóbrega


Não imito apenas
os cabelos do meu pai
o nariz da minha mãe:
Tomei-lhes emprestado também
o seu andar
a sua voz
a sua maneira de amar
     e de morrer ...

sexta-feira, 22 de março de 2013


        DEZ MIL NOVECENTOS E CINQUENTA DIAS, SEM MILTON DIAS

POR SILAS FALCÃO

Há trinta anos morria um dos nossos maiores cronistas: Milton Dias. Era 9h de 22 de 03 de 1983, na Casa de Saúde São Raimundo. Óbito: miocardia. Cronista semanal d´O Povo, neste 22/2013, nenhuma lembrança pública. Nem crônica em sua homenagem. Sequer aplausos coletivos.

Mas nem todos agem assim. Milton Dias é nossa eterna relembrança.
Nos dias 06 e 07 de junho de 2011, o SESC- Fortaleza realizou o III Seminário Revelando a Literatura Cearense com o tema Milton Dias - o eterno contador de estórias. Foram duas noites de palestras com o escritor e amigo de Milton Dias, prof. Pedro Paulo Montenegro que falou sobre Crônicas e memórias de Milton Dias. A professora de literatura Suely Oliveira abordou a sua dissertação: Milton Dias - a vida que poderia ter sido e que não foi. Depoimentos de ex-alunas  de francês do cronista e declamações de trechos das crônicas de Milton Dias com o Grupo Converso diversificaram o conteúdo literário do Seminário.

Incorporando aos colégios municipais e estaduais, O SESC-Fortaleza realiza o Projeto Revelando a Literatura Cearense, onde parceiros do SESC falam sobre autores cearenses. Mensalmente eu participo deste projeto com Milton Dias: entre a dor e o riso. 
Em 2010, através do Centro Cultural Banco do Nordeste – CCBN – mediei o Percurso Urbano Passeio com Milton Dias, título de uma crônica homônima de Carlos Roberto Vazconcelos.
Com o apoio do jornal O Povo desenvolvo, através do banco de dados deste jornal, pesquisas  das crônicas que Milton Dias escreveu nos seus 26 anos de cronista semanal. 

      

          
        CONFISSÃO
Quando eu morrer, Mãe,
esquece este filho,
tão triste, tão pobre,
que só pede uma planta no túmulo.
Quando eu morrer, Mãe,
tudo o que eu peço
é uma oração crepuscular.
Quando eu morrer, Mãe,
perdoa a falsa alegria,
o riso gratuito
a alegria postiça
que escondia uma tristeza tão grande
que você, Mãe, nunca suspeitou.
Quando eu morrer, Mãe,
perdoa os erros todos deste filho
que nunca deixou de ser criança.


Rua da Goela - IPU - onde Milton Dias nasceu.

1960

1966

1966
1971
1974
1977
1977
1978
1978
1982
Homenagem póstuma-1983

Milton Dias deixou inédito o romance A senhora da sexta-feira e  Memórias de um professor de francês, sobre sua experiencia como professor da casa de cultura francesa- UFC.

“Quando Milton Dias morreu, na manhã de 22 de março de 1983, deixou vago o seu lugar de melhor papo das rodas palestreiras desta terra de mares tão verdes, sábados líricos e tantas coisas que contar. Seus amigos o choraram em prosa e verso e alguns ainda apontam para o céu, em noites de nuvens escassas e muito uísque, de onde ele, feito estrela, ilumina a saudade de todos. Foi assim que Olga Stela o viu, quando produziu o poema”
 
                                     BALADA PARA O ENCANTADO
Na Ilha do Homem Só
No barco da Capitoa

Nas velas todas do mar
Lá está ele
Encantado

Nas cores do sol poente
Em cada boca da noite
Na brisa do alvorecer
Lá está ele
Encantado

Na várzea do Sete-Estrelo
No disco da lua cheia
No bojo da madrugada
Lá está ele
Encantado

Na Viagem do Arco-Íris
Na ciranda das Cunhãs
Nas ruas de Fortaleza
Lá está ele
Encantado

No compasso da viola
Nas noites de sereneta
Em cada gole de vinho
Lá está ele
Encantado

Nos pagos do Massapê
Na neblina que esvoaça
E abraça a Bica do Ipu
Lá está ele
Encantado

Nas ondas verdes do mar
De sua terra natal,
Nas águas do rio Sena
Lá está ele
Encantado

Nas baladas do sino
No toque da Ave-Maria
Na suavidade da tarde
Lá está ele
Encantado

Embaixo do pé de jambo
Onde a relva é sempre verde
Na morada mais singela
Lá está ele
Encantado

Na saudade que não passa
Em cada instante que passa
Na memória mais constante
Continua ele
Encantado

Continuará encantado
Como a estrela que morre
E seu brilho no firmamento
Permanece
Encantando”


                                                 SOBRE A AMIZADE
Amizade não se impõe, não se força, não se transfere, não se delibera, tem a sua linguagem própria, até nos silêncios, nos gestos mais simples; é mais sólida do que o amor, muitas vezes baseado apenas na afeição física, que os anos podem desgastar – enquanto a amizade se aprimora, se fortifica, melhora com o tempo. É que nem o vinho”
Cartas sem resposta
 

                              O POVO: 85 anos presente no Ceará V

Raymundo Netto especial para O POVO


João Dummar

“Nós, radialistas cearenses, devemos a João Dummar a nossa profissão (...)”
Narcélio Limaverde

O ano: 1941. O jornal O POVO, por meio de Demócrito Rocha e Paulo Sarasate, lança campanha junto ao comércio, além da implantação do sistema de assinaturas em longo prazo, com o objetivo de angariar recursos para compra de novos equipamentos e da primeira sede própria. Dentre os anunciantes, o amigo e futuro genro, João Dummar, “um rapaz alto, gordo, olhos azuis, sempre alegre, com intensa vida social. Solteirão, bonitão, rico, o Rodolfo Valentino das moças da terra. Um gentleman, um coração do tamanho do Pão de Açúcar.”(1)

João Dummar nasceu em Damasco, Síria, em 1903. Seus pais e a família — eram cinco os filhos — migraram ao Brasil. A princípio, em Belém do Pará, dirigindo-se depois a uma atrasada Fortaleza de 1910. Em janeiro do ano seguinte, com o falecimento de sua mãe, Adla, o pai, Demétrio, decidiu estabelecer comércio, a Princesa do Norte, no Crato, onde os filhos cresceriam entre atividades comerciais, teatro, música e o futebol (o seu irmão, Jorge, fundou, em 1919, o Crato Football Club).

Em 1921, com objetivo de ampliar a loja, a família inaugurou sede em Fortaleza. Os filhos João e José, então, seriam sócios do pai. Porém, em 1926, Demétrio sofreu infarto fulminante, e, dois anos mais tarde, os dois irmãos — João com 25 anos —, fundariam a Casa Dummar, na Floriano Peixoto, onde representariam a Philips, a Philco (vendiam rádios e receptores), os pianos Essenfelder (costumava tocá-los na loja como “demonstração”), a Remington, a Brunswich, a RCA Victor, o automóvel Skoda e diversas outras marcas de eletrodomésticos da época, não apenas para o Ceará, mas ao resto do país.

Jovem, excelente comerciante e visionário em seu tempo, João era grande apreciador de arte e da cultura, principalmente da música (chegava a vender pessoalmente os discos de sua loja), e sonhava em implantar a primeira estação de rádio do Ceará, por saber da amplitude que teria a radiodifusão na propagação da cultura, principalmente a cearense, além de democratizar o acesso do povo à boa música brasileira que surgia, mas que, praticamente, estava concentrada nas mãos, e ouvidos, dos mais abastados. Eduardo Campos conta: “(...) Mas o seu forte mesmo era o lado artístico, acentuado gosto musical, em quinze minutos de conversa ele e eu íamos de anúncios a aspiradores de pó, de baterias para rádios e concertos de piano, à música clássica...”(2)

Assim, em 28 de agosto de 1931, há 82 anos, João Dummar fundou a Ceará Rádio Clube, associação integrada por amadores da radiotelefonia (como se chamavam as atividades de radiodifusão), e, em 30 de maio de 1934, são inauguradas as instalações da Ceará Rádio Clube, operando com transmissor no bairro Damas e com estúdio na rua Barão do Rio Branco, sistema de ondas curtas, que recebeu em seus programas de auditório, durante anos (a Era Dourada do Rádio), cantores e músicos nacionais e locais, como: Orlando Silva (inaugurou a Rádio), Francisco Alves, Chico Viola, Uyara de Goiás, Milton Milfont, Sílvio Caldas, Carlos Galhardo, Lauro Maia, Romeu Menezes, “4 Azes e 1 Coringa” (conjunto batizado por Demócrito), José Menezes, As “Três Marias”, etc. Dentre os programas, a “Hora da Saudade” e “Coisas que o Tempo Levou”, com o speaker José Limaverde (pai do grande radialista Narcélio Limaverde), “Jazz PRE-9”, com Lauro Maia, “Sorriso de Iracema”, com Paulo Cabral de Araújo, a “Hora Infantil” (aos sábados e dedicado às crianças), com Zilda Maria Rodrigues e o próprio João, além do “Arte e Pensamento”, dirigido por Filgueiras Lima. Na época, a Rádio recebia retorno de ouvintes da Austrália, África do Sul, Califórnia, Inglaterra, dentre outros. O seu estúdio chegou a ter dois pianos, um francês, de cauda, e um nacional, baú. Nos cafés de Fortaleza se encontravam pequenos rádiorreceptores, em caixas de madeira, onde se ouviam os noticiários e a programação da PRE-9 — como era chamada a Rádio —, além de alto-falantes distribuídos em pontos estratégicos da cidade, até na Coluna da Hora, no centro da Praça do Ferreira. Conseguiu João, em discos de acetato, os primeiros lançamentos de Dorival Caymmi. Sem dúvida, João Dummar foi um dos maiores incentivadores dos profissionais da música cearense, empregando e apoiando muitos (cedendo-lhes até instrumentos musicais, além de contratar locutores, diretores artísticos, músicos, maestros, cantores, redatores, técnicos, etc.) que conseguiram destaque, inclusive no exterior (Lauro Maia, por exemplo), representando um dos maiores elementos da história da comunicação cearense. Também ele, iniciou a utilização do veículo para anúncios, ampliando o comércio cearense para o nordeste e ao mundo. Na sede da PRE-9 também formou uma orquestra de câmara, dirigida por Hércules Vareto, maestro italiano. E, daí, surgiu-lhe grande problema: era período de guerra. A Itália fazia parte do “Eixo”, aliada à Alemanha de Hitler. Na época, João mandou colocar, no topo do Ed. Diogo (segunda sede da PRE-9), uma série de pisca-piscas. Então, correu uma boataria de que “aquilo” emitia mensagens codificadas do “italiano” (o maestro) para os submarinos inimigos. O cônsul americano em Fortaleza ameaçou fechar a emissora com denúncia ao governo, o que só não aconteceu devido à intervenção do amigo Demócrito Rocha.

Demócrito, sensível em reconhecer talentos e o empreendedorismo das novidades, logo se afeiçoou ao jovem Dummar e passou a criar com ele campanhas e concursos, como o de versos, além de um festival de marchas carnavalescas cujo juiz foi Ary Barroso, inesquecível autor de “Aquarela do Brasil”. Era muito comum serem vistos juntos em eventos locais, sendo estreitados os laços de amizade quando João passou a frequentar a sua casa, e apaixonou-se por Lúcia, a caçula do jornalista.

Em 1941, João adquiriu um moderníssimo transmissor de ondas curtas, o terceiro instalado no Brasil (os outros dois pertenciam à Rádio Nacional do Rio de Janeiro e Rádio Clube de Pernambuco), fazendo da PRE-9 uma das mais sofisticadas e avançadas estações radiofônicas brasileiras.

Em 1944, João Dummar, a contragosto, após diversas manobras de Assis Chateaubriand para adquirir a Ceará Rádio Clube, a vendeu. Motivo: a lei exigia que os direitos de concessão de radiodifusão só pudessem ser cedidos a brasileiros natos ou naturalizados. João não o era, e a burocracia toda estava emperrada, principalmente após a implantação do Estado Novo. Assim, em 11 de janeiro de 1944, rendeu-se às investidas e a sua rádio passou a fazer parte da rede dos Diários e Rádios Associados.

Em 28 de janeiro de 1944, João casou-se com Lúcia e, dessa união, nasceram seis filhos: Demócrito, Lúcia Maria, Lúcia Helena, João Dummar Filho, Carmen Lúcia (que, segundo João, era a que mais se assemelhava à avó, Adla) e Albanisa Lúcia.

João, apesar da idade, tinha diversos problemas de saúde. Em 14 de julho de 1954, por conta de uma peritonite, faleceu. A Ceará Rádio Clube, assim como outras rádios locais, guardou um minuto de silêncio e pesar em homenagem a este homem que partia, com apenas 51 anos, o grande pioneiro e defensor da radiodifusão no Ceará, incentivador da cultura de um Ceará que o acolhera. (3)

(1) Edmar Morel, jornalista e antigo vendedor da Casa Dummar, em depoimento para O POVO, em 1984.
(2) Eduardo Campos, para Traços de União, de Adísia Sá, 1999.
(3) Para saber mais sobre João Dummar, leia João Dummar: um pioneiro do rádio, de João Dummar Filho, das Edições Demócrito Rocha.

sexta-feira, 15 de março de 2013


                                                    
  Sobre bolos
           Carlos Nóbrega

Este bolo de aniversário
mais iluminado do que o Círio de Nazaré
não presta.
A vida
no sentido da felicidade,
a vida
é se lembrar.
Não mais que doze,
no máximo quinze
velinhas
para soprar.


quarta-feira, 13 de março de 2013


ANTENADO

Crônica de Pedro Salgueiro, para O Povo.


Mesmo me considerando um sujeito medianamente “antenado”, de quando em vez me deparo com alguma informação que me deixa de “cabelo-em-pé” (não riam, é apenas uma expressão, como os hífens denunciam), tal o ineditismo da referida palavra ou frase em meus já peludos ouvidos (também o mesmo estranhamento se dá quando escuto alguém se referir a determinados cantores, artistas em geral, e até mesmo aos famosos por quinze minutos que um dia Andy Warhol nos preveniu).

Quando aqui cheguei do interior, inocente puro e besta (como bem cantou Raulzito), uma das primeiras coisas que me chamou a atenção foi o uso de expressões, digamos, “moderninhas”; os garotos de minha idade eram “descolados” pra chuchu. E mal entrei em sala de aula, um de meus primeiros colegas me sapecou logo um “Fala aí, Barão!”. Quase saí correndo: eu que era no máximo versado em “Diz aí, bicho!”.

Na época, início dos anos 1980, as coisas se passavam lentamente, demoravam uma eternidade (que conclusão filosófica, não é mesmo!?, deve ser a ressaca do fim de semana) para caírem em desuso; também as gírias e expressões duravam séculos, dava tempo de a gente ir se acostumando, fazendo a ruminação devagarinho, até as oiças se renderem ao termo falado “a-torto-e-a-direito” pela moçada.

Mas a velocidade internética foi trazendo a reboque uma enxurrada de neologismos, palavras da moda de todos os feitios e gostos. E o que é pior (ou melhor?): passando com uma velocidade espantosa; mal aprendemos e já são velhas. Minha filha mais nova é quem me denuncia o anacronismo dos termos que teimo em usar: “Ô, pai, ninguém fala mais assim!”; em seguida dá sua risadinha irônica. Já meu filho, mais casmurro, usa quase nenhuma modernidade no linguajar, diferentemente da irmãzinha, não se rende facilmente a novidades.

Não faz muito tempo sentia verdadeiros calafrios ao ouvir o indefectível “tipo assim” em meio a qualquer frase de qualquer idiota de qualquer idade. Um dia, para espanto meu e da amiga com quem estava falando, sapequei, num deslize fatal, no meio de uma frase comum o odiado termo. Parei a conversa, balancei constrangido a cabeça e esqueci completamente o que estava dizendo.

Mentalmente resolvi desistir de me estranhar (e de me espantar, principalmente) quando escuto qualquer barbaridade adolescente em forma de gíria. Engulo fundo, dou até um rizinho de triunfal resignação (e superioridade, claro): eu que nunca fui afeito a purismos de qualquer espécie me rendo finalmente ao império fatal das expressões populares. Eu, não mais que ninguém, que sou dos “cafundós-do-Judas”, de onde o “vento-faz-a-curva”, filho de um singelo sapateiro “lambe-sola”, tenho mesmo é que ser popular. Ora, pois-pois!

Minha “santa-paciência” durou até a semana passada, quando, ao trafegar desajeitadamente com meus mais de noventa quilos pelos corredores estreitos de uma livraria, resolvo pedir desculpa a uma freguesa pelo esbarrão involuntário.
— Me desculpe, senhora!
Então ela se saiu com essa pérola do linguajar televisivo, digno das piores misturas do axé-music com humor-de-pizzaria e mais o famigerado forró-eletrônico com pitadas de diálogos do BBBesta, com os quais o inferno está plenamente entupido:
— Que nada, “de boa”! — Diz a magrinha leitora, com cara de professora universitária.

Imediatamente o meu “versículo” esquerdo deu um nó no direito, subiu até a garganta quase me sufocando. Pensei em respostar na “bucha”: “De boa” é o cascalho, minha senhora!

Mas me controlei, respirei fundo e saí da livraria, me esquecendo até do livro que andava procurando.


segunda-feira, 11 de março de 2013

                           

                                                         ESCALPE
 Anza entra no necrotério. Escolhe o cadáver de uma bela jovem. Com um bisturi, remove o rosto, colocando sobre o seu como um capuz.
“Agora não serei reconhecida”- diz ela.

Do livro de microcontos O colecionador de dedos
Silas Falcão
EUGÊNIO LEANDRO


por Danilo Castro - Jornal O Povo


Mansidão da terra

Da seca de 1958 em Limoeiro do Norte à militância na Fortaleza dos anos 1980, o músico e escritor Eugênio Leandro rememora os caminhos que escolheu trilhar

Eugênio Leandro: "Minhas conquistas foram por causa dos amigos"

Numa manhã quente, encandeada pela luz refletida do mar, aconteceu o encontro. Olhando para o Estoril fechado, o músico e escritor Eugênio Leandro se desmancha em saudosismo. “Foi aqui que tudo começou. Aqui lancei todos os meus discos”. A Praia de Iracema é um dos recantos mais amados do telúrico irremediável. Lugar de plena efervescência artística durante a década de 1980. A caminhada pela rua dos Tabajaras foi marcada de boas lembranças.
                                    
Fugindo da seca de Limoeiro do Norte, o pai e a mãe de Eugênio o fizeram nascer em Fortaleza, mas, antes mesmo de completar um ano, o menino retornou ao berço interiorano devido a uma proposta de emprego que o pai recebeu. “Eu era o ‘menino de Fortaleza’, as pessoas achavam isso importante, mas eu não sabia o que era aquilo, ficava incomodado”. Somente seis anos depois, ele visitou a Capital pela primeira vez. “Papai me levou pra ver o mar do Passeio Público. Foi um encantamento tão grande”, lembra, como se a maré verde brotasse dos próprios olhos.
Em Limoeiro, criou suas primeiras referências musicais em meio aos embaladores, cirandeiros e repentistas. “Lá é uma terra de intensidades. O sertão é minha fonte de criatividade”. O pai, violonista de varanda, foi guiando o caminho do menino estudioso que sonhava em ser escritor, mas acabou encontrando a música no meio do caminho como um de seus talentos. “Ele dizia para mim: gaste seu dinheiro e seu ouvido com música”, lembra. Durante os fins de tarde, o menino observava o pai tocar a viola embalado pelo som em meio à “hora dos magos”, quando não é dia nem noite. O termo deu nome ao disco lançado em 2009.
Aos 20 anos, retornou de vez para a cidade grande e formou-se em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC), mas atuou na área por apenas um ano. “Eu gostava de estudar Direito, mas não gostei da área em si. Fiz para satisfazer a família, ser advogado em Limoeiro era uma honra para as pessoas”. Ao todo, são quatro livros lançados e cinco discos. “Minhas conquistas foram por causa dos meus amigos. Logo que cheguei, levei meus textos para Rogaciano Leite ler, ele gostou e passei a ser publicado”. Os escritos foram publicados no O POVO e compuseram o livro Rei Piau, de 1985. Dentre os prêmios na literatura, o conto “A Licença”, do livro A Noite dos Manequins (2011), foi traduzido para o búlgaro por Rumen Stoyanov – tradutor de García Márquez e Drummond - e participou do Concurso Internacional de contos Humorísticos Aleko Konstantinov, nascido há 150 anos, na Bulgária.
                                (Eugênio Leandro com Patativa do Assaré)
Na década de 1980, o Eugênio fez diversos shows no Rio de Janeiro e em São Paulo cantando com músicos como Chico César. Contudo, o fortalezense de Limoeiro sempre compreendeu que seu lugar é aqui, não por bairrismo, mas por prazer. “Tinha gente que dizia que eu era um passarinho no ninho, que se eu morasse lá eu poderia voar. Já Belchior me dizia: aqui você tem nome, lá você será só mais um”. Eugênio já dirigiu para cinema e teatro, além de dedicar-se à escultura nas horas vagas. Para 2013, ele planeja realizar um filme e um disco com o ator e amigo Rodger Rogério, além de lançar o cordel sobre a cantora bluseira Lily Alcalay, que morreu em 2003, vítima de câncer.

Depois de alguns cigarros e refrigerantes à beira da Ponte dos Ingleses, o entrevistado foi desafiado a se autoperfilar, rememorando sua trajetória desde o menino limoeirense, passando pelo artista militante em tempos de ditadura até chegar ao homem maduro que é hoje. O comentário, depois de uma pequena pausa, veio sorrateira. “Essa pergunta parece uma bala nos peitos, vou ali comprar outro refrigerante”, brinca. No auge dos seus 54 anos, após refletir com seus botões, ele conclui. “Hoje me levo menos a sério. Antes eu queria ‘catequizar’ o mundo com minha música, agora só atinjo as pessoas interessadas” e sorri, orgulhando-se da mansidão que sedimentou em si durante os anos.


EUGÊNIO LEANDRO
Por Pedro Salgueiro
                Conheci Eugênio Leandro quando ele lançou o disco “Além das Frentes”, e gostei tanto que logo fiquei fã de sua voz marcante e das letras que instigavam a minha cabeça de jovem estudante interiorano exilado na capital. Na primeira oportunidade fui à sua casa-estúdio, ali na Aldeota, por trás do Hospital Militar, pertinho do bar Bebedouro, e o conheci pessoalmente; recordo que na ocasião se encontrava lá Abidoral Jamacaru, com seus vozeirão e jeito manso.
De lá pra cá tenho encontrado frequentemente o amigo limoeirense em shows, mesas de bares e lançamento de livros, pois ele se tornou (já havia publicado o livrete de histórias curtas Rei Piau na década de 1980) um contista dos bons, lançando recentemente o premiado A Noite dos Manequins, que já esgotou várias edições, cada uma trazendo a capa do livro com uma cor diferente.
 Os amigos lhe cobram insistentemente mais um disco, alguns (como eu) pedem para que deixe de fumar tanto, estragando uma das vozes mais bonitas e marcantes da nossa música. Ele apenas ri, dá mais uma baforada, despeja uma geladinha goela abaixo e promete empolgado terminar o romance que há décadas bola insistentemente em sua cabeça.
Torço para que continue cantando, fazendo livros e sendo o amigo de sempre.


INAUGURAÇÃO DO BUSTO DO POETA JOSÉ CORIOLANO
PRAÇA JOSÉ CORIOLANO

CRATEÚS- 08 DE MARÇO 2013



Poeta Edmilson Providência
Poeta Raimundo Cândido


                                                       Edmilson Providência




R. Cândido com a poesia manuscrita do José Coriolano, Silas Falcão e Anastácio Soares
O jornalista Zacarias
O prefeito de Crateús, Carlos Felipe, entregando uma carta do papa Bento XVI a Dona Rosa Morães
                      
                                      Ivens, trineto do José Corialono e Edmilson Providência
                               
                               
                                                                Flávio Machado
Minha professora no ginasial, Dona Rosa Moraes que completará 100 anos em outubro.

quarta-feira, 6 de março de 2013




VARIAÇÕES SOBRE A MORTE

Francisco Carvalho

Quando o homem perde
o primeiro fio de cabelo
começa a dialogar com a morte.

A morte, ausência
de todas as sensações,
é a mais ostensiva das presenças.

Ninguém consegue fugir da morte
pela simples razão de que
somos hospedeiros dela.

A morte chega, apaga
a luz dos teus olhos e acende
os seus negros castiçais.

Algum dia te visitará
uma sombra de olhos de areia
e bruscamente cerrará tuas pálpebras.

Morte, ó ceifeira veloz.
Quantas são as espigas
que abastecem o teu celeiro?