SERTÃO: POETAS E PROSADORES
O sertão é quase uma incógnita, uma esfinge. Como popularmente se diz: “o sertão não é para os fracos”. Para se viver no sertão, já dizia Euclides da Cunha, precisa-se ser, antes de tudo, um forte”. E o que será que diria o autor do clássico Os Sertões (1902 ) sobre viver e escrever no sertão? Na verdade, o sertão nem sempre precisa ser o sertão. Itamar Assumpção, por exemplo, diz: “ São Paulo é meu sertão”.
No Dicionário do Brasil Colonial (1550 – 1808), Ronaldo Vainfas traz um esclarecedor verbete denominado “sertão”. Contudo, o sertão de Vainfas é, em muito, diferente do sertão que nos engole de dia com seu calor infernal, mas que à noite nos agasalha e nos protege contra o frio trazido pelo vento Aracati. E é das vozes desse sertão que o escritor Bruno Paulino trata em seu mais recente livro intitulado Sertão: poetas e prosadores (2017), publicado pela expressão Gráfica e Editora.
O referido trabalho é constituído por 109 páginas, contendo dezenove perfis de autores que, de uma forma ou outra possuem relação com o sertão, mais especificamente, com a cidade de Quixeramobim, situada no Sertão Central do Estado do Ceará. O livro conta também com um prefácio assinado pelo poeta Rodrigo Marques, professor da Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão Central – FECLESC, da Universidade Estadual do Ceará – UECE. A apresentação ficou por conta do escritor Arievaldo Vianna; enquanto o posfácio, por sua vez, ficou a cargo de Alves de Aquino, o Poeta de Meia-Tigela.
Ao longo de Sertão: poetas e prosadores, Bruno Paulino discorre sobre seus encontros e conversas com importantes nomes da cultura brasileira. Dessa forma, estão presentes no trabalho Audifax Rios (Aqui, tem-se uma bela homenagem à memória de Audifax, quando as páginas estão em preto e a indicação dessas páginas é feita com as letras do nome do artista), Marcos Mairton, Luiz Gonzaga, Geraldo Amâncio, Arievaldo Vianna, Rouxinol do Rinaré, Klévisson Vianna, Luiz Costa Filho, João Eudes Costa, Gordurinha, Alberto Porfírio, Moacir Costa Lopes, Vasco Benício, Claudio Portella, saraiva Júnior, Jards Nobre, Diogo Fontenelle, João Pedro do Juazeiro e J. Bosco Fernandes.
Bruno Paulino, certamente, fez uma seleção dos poetas e prosadores dos quais gostaria de falar na obra em questão. E, talvez por isso, alguns poetas e prosadores de enorme relevância acabaram ficando de fora. Assim sendo, sentimos falta de um capítulo que fosse dedicado ao Cego Aderaldo (o capítulo “Claudio Portella e ampla visão de Cego Aderaldo”, p. 79 – 84, traz Portella falando sobre Aderaldo), bem como outro dedicado a um dos nossos poetas maiores, Jáder de Carvalho. Nonô da Sanfona (mencionado no capítulo “O rei do baião em Quixeramobim”, p. 30 – 33) também merecia um capítulo só pra ele, assim como o poeta Fausto Nilo, mencionado no mesmo capítulo. Percebemos ainda em Sertão: poetas e prosadores, a ausência de poetisas (o termo “poeta” também pode ser usado no feminino) e prosadoras, as quais, sabemos, existem em grande quantidade pelos nossos sertões; sejam eles “são paulos” ou “quixeramobins”.
E embora os textos que compõem Sertão: poetas e prosadores tenham sido escritos para publicação em jornal; o que poderia caracterizá-los como “perfis jornalísticos”; implicando em uma linguagem mais específica para o veículo, não é isso que se dá. O que se percebe é a linguagem “nua e crua” da crônica dominando todos os textos assinados por Bruno Paulino, o que, de imediato, salta aos olhos do leitor das referidas narrativas.
Assim sendo, Sertão: poetas e prosadores (2017) não deve ser compreendido como um livro de crítica literária ou uma coletânea de perfis, por exemplo, mas como um agradável livro de crônicas que se erigem a partir de uma ideia central, seja um autor, um fato ou uma obra, mas que descambam livremente para outros caminhos, permitindo as mais variadas interpretações que só são possíveis no contexto da abertura proporcionada pela própria obra.
Postagem original aqui:
http://blogdocarloscarvalho.blogspot.com.br/2017/03/sertao-poetas-e-prosadores.html