terça-feira, 17 de janeiro de 2012


NENHUM DE NÓS (Pedro Salgueiro para O POVO)



(André Kertész) 

Quantos carros neste momento atropelam, arrastam, esfolam alguém que está vivo? E em quais lugares do mundo acontece tal fato neste exato instante? Todos tão iguais, tão diferentes — a velhinha morta ao atravessar a rua para comprar fósforos, uma criança que parou sua alegre corrida atrás da bola fujona, um homem forte colhido na linha-férrea depois de ter recebido todo seu salário, a família que foi perder dois de seus membros na saída triunfal de um feriado na praia, os dois jovens esmagados em plena parada de ônibus enquanto namoravam — todos no mesmo instante e em todas as partes do mundo: tão diferentes e tão iguais.

O que nos une em todos estes acontecimentos? O que pulsa junto ao coração suspirante das vítimas? Essa nossa multidão de anônimos que largam tudo o que estejam fazendo. Batem no automóvel parado em frente. Soltam a mão do filho pequeno. Se arriscam a perder emprego e prestígio — para ir lá ver de perto. De mais pertinho que nos deixem... E arregalar olhos, e chorar lágrimas, e rezar terços: mas ter o que contar em casa, no trabalho, na escola — e ficar extremamente chateado se não acontecer nada, e sair inconsolavelmente desapontado se tudo acabar bem.

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