segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Sábado, 05/11, alguns dos Poetas de Quinta se encontraram, pela segunda vez, no agradabilíssimo sítio do Bernivaldo Carneiro. Os anfitriões se esmeraram  no cardápio e no sorriso. Infelizmente alguns dos Poetas que confirmaram presença, não compareceram. Um telefonema demonstraria ato de respeito a quem organizou espaços, talheres, mesa do self-service, cervejas, dois churrasqueiros, mesa do ping-pong, sinuca e piscina.

Agradecemos ao Bernivaldo e a Anastácia pelos momentos de descontração, música e bons papos.  

Silas Falcão.


sexta-feira, 4 de novembro de 2011


                            Lançamento Para Mamíferos nº 3

Data: 5 de novembro de 2011 (sábado) – DIA NACIONAL DA CULTURA
Horário: 19h
Local: Auditório do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (ao lado do Planetário)
Valor da Revista: apenas R$ 10,00
Editores: Tércia Montenegro, Jesus Irajacy Costa, Pedro Salgueiro, Glauco Sobreira, Nerilson Moreira e Raymundo Netto
Colaboraram com esta edição: Henrique Beltrão, Karla Martins, Dodora Guimarães, Narcélio Limaverde, Everardo Norões, Luci Collin, Poeta de Meia-Tigela, Lúcio Cleto, Ricardo e Elizabeth Bezerra, Thiago Arrais e Pedro Rogério.
Para adquirir a revista posteriormente (informações): paramamiferos@gmail.com
Durante o coquetel os editores e autores autografarão seus artigos e produção

             Relise da revista de letras e artes Para Mamíferos
 A Para Mamíferos, revista de Letras e Artes, independentemente editada por Tércia Montenegro, Jesus Irajacy Costa, Pedro Salgueiro, Glauco Sobreira, Nerilson Moreira e Raymundo Netto, surpreende sempre a cada edição.
Em seu terceiro número, traz na capa a assinatura de Leonilson, artista plástico cearense, nascido em 1957 e morto em 1993, em São Paulo, muito jovem, onde desde 1985, na concorrida Bienal de São Paulo, firmara sua carreira no cenário artístico contemporâneo, nacional e internacionalmente, com seu estilo, fosse em cores ou em preto e branco, de intensa paixão. Também é dedicada à memória desse nosso artista, ainda muito desconhecido por sua gente, as palavras de abertura pela curadora e consultora de artes, especialista em artes plásticas, Dodora Guimarães.
Maria Valéria Rezende, educadora popular e escritora paulista radicada na Paraíba, ganhadora do Prêmio Jabuti em 2009, traduzida e publicada em diversos países (Argentina, Itália, Portugal e Espanha), nos apresenta o conto “Pelas Superfícies”, além de breve biobibliografia.
A coluna “Literatrilhas” nos leva, pelos olhos e palavras do poeta, radialista e compositor Henrique Beltrão e da psicóloga e pesquisadora Karla Martins, a Nantes, na França (ou Bretanha?), onde “há de se dar de coração”. Então, merci pour la compagnie!
O entrevistado especial da edição veio por um “Resgate de Arquivo”. Com fotos inéditas ao público, Gilmar de Carvalho, jornalista, publicitário, pesquisador e ficcionista, fala de sua infância, de suas primeiras leituras, os primeiros escritos, o namoro com a Literatura, a iniciação jornalística, a perseguição pelo DOPS e a censura, os movimentos culturais cearenses, o teatro, o processo criativo e Parabélum 30 anos depois. IMPERDÍVEL!
“Interiores” ocupa o espaço “dossiê cearense” da nova edição. Sabido que muitos dos escritores cearenses, mesmo os que residem na Capital, vêm do interior, a Para Mamíferos voltou os olhos para “dentro”, em algumas das regiões do Ceará, e encontrou: Dimas Carvalho (Acaraú), Joan Edesson (Cedro), Luciano Bonfim (Crateús), Társio Pinheiro, Dércio Braúna, Kelson Oliveira (os três de Limoeiro do Norte) e Webston Moura (Morada Nova).
Um presente especialíssimo para os leitores e ouvintes da Para Mamíferos, desta vez, não vem da revista, mas do RÁDIO: Narcélio Limaverde, jornalista, radialista e autor de Senhoras e Senhores e de Fortaleza, História e Estórias: memórias de uma cidade, pioneiro e testemunha ocular (e auricular) da construção da história do rádio no Ceará; uma das vozes mais fiéis e confiáveis do povo cearense, por meio do jornalista Nerilson Moreira, nos pinta, em modestas oito páginas, o que a sua frase “O rádio é minha vida” resume com toda a verdade e beleza.
“Numa Outra Língua”, sessão dedicada à tradução inédita, o conto “El Barranco” de José Maria Arguedas (escritor e antropólogo peruano que estaria completando 100 anos em 2011) é passado a limpo por Everardo Norões, e os poemas da irlandesa Eiléan Ní Chilleanáin nos chegam pela voz da curitibana Luci Collin.
O registro fotográfico de Para Mamíferos ousou penetrar no mundo de répteis, insetos e fósseis de sucata do escultor metalista Lúcio Cleto (Mostra Reciclarte, Espaço Cultural dos Correios, Mostra 8 de maio – UNIFOR, dentre outros). O som dessa exposição vem da tigelira e da tigelavra do Poeta de Meia-Tigela (Alves de Aquino).
Na “Caixa de Espantos”, espaço dedicado à produção poética e de contos: Carlos Vazconcelos, Raymundo Netto, Carlos Emílio Corrêa Lima, Daniel Mazza, Majela Colares, Alan Mendonça, Jesus Irajacy Costa, Astolfo Lima Sandy e Ceronha Pontes.
Thiago Arrais, ator e professor do curso de Teatro da IFCE, pensa e repensa o teatro, cortinas abertas, da multidão, “por um corpo corajoso que se canse de esperar”.
A “desrotulação” da vida e da obra do goiano José J. Veiga, considerado um dos maiores expoentes do fantástico em nosso país, em “Cabacinha de água endurecida ou garrafa de coca-cola”, texto de Márton Tamás Gémes, doutor em literaturas de língua portuguesa pela Universidade de Köln/Alemanha. De quebra, sugestões de bibliografia sobre o autor e “Reversão”, conto não incluído em sua bibliografia oficial.
Pedro Rogério, radialista, compositor e doutor em Educação pela Universidade Federal do Ceará, analisa o “Pessoal do Ceará”, desta vez, com destaque para o compositor de “Cavalo Ferro” e de “Manera Fru Fru Manera”, dentre outros, Ricardo Bezerra, “continuador da antropofagia moderna de Mário e Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e todos aqueles inquietos intelectuais (...) um tropicalista cearense que transcende os limites do óbvio”.
Na curiosa seção “Como Você Nunca Viu”, Airton Monte, o cronista do Benfica e d’O POVO, revela sua face ALIENista... Caso queira, um poster para parede de seu quarto!

Apoio Cultural
Queiroz Galvão
UNICRED

quarta-feira, 2 de novembro de 2011


     Coisas Engraçadas de Não se Rir XV: O Estandarte do Coronel

Raymundo Netto para O POVO

Coronel Oswaldo era um viúvo octogenário. O síndico perfeito. Homem de temperamento forte e austero, se distinguia pela invulgar habilidade de comando, fruto de anos dedicados às Forças Armadas de um Brasil. Procurassem, fosse na hora que fosse, acolhia pacientemente as lamentações das moradoras — os maridos não lhes davam a menor bola — que o palmeavam e o exaltavam na hora da janta: “Que homem esse é o seu Oswaldo!”
Entretanto, guardava ele um silêncio: a doraguda de um falo desanimado. Para o orgulhoso militar, imperdoável. Soube, porém, num fortuito dia, e decidiu implantar uma prótese peniana. Tudo envolto no mais absoluto sigilo, claro, e que Deus o livrasse se alguém supusesse um dia de a sua vergonhosa fragilidade!
Com a tecnologia a seu favor, Oswaldo não deixaria mais de bulir em seu brinquedo. Nem não acreditava naquilo. Soubesse, teria feito antes... Passou a querer a toda hora, a todo instante. Fosse mulher, passasse a vista, agora sabia: apertava aquela bombinha na mais segura possibilidade.
As domésticas, diaristas, as mocinhas da rua e mesmo uma ou outra colega de faculdade da filha, vacilassem, o coronel as colocava em sua linha de fogo.
Mas, de iniciada a brincadeira, ao acionar a bombinha milagrosa, tinha ele a mania de exigir da companheira a apresentação de continência ao “glorioso estandarte”, como assim apelidara o membro ora ascendente e vigoroso.
As coitadas, a princípio, o faziam por graça, depois percebiam-lhe o modo estranho, exigido cerimonialmente a cada nova intervenção. Atrevessem dispensar-lhe tal continência, o desagrado era profundo, de esboçar uma carantonha, puxar as parceiras ao colo e dar-lhes tapas vigorosos na bunda, que era para discipliná-las. A ordem, então, seria no tapa!
Daí, em pouco, a mania do coronel passou a povoar o clássico fuxico das áreas de serviço do prédio. As senhoras fingiam, outras nem tanto, mas enojavam-se da tara do velho. Os moleques de rua, montados em bicicletas, passavam-lhe a prestar continências gargalhosas. Os maridos não deixavam mais suas mulheres trocarem miúdos com aquele homem, outrora muleta útil do matrimônio alheio, que, por fim, teve a sua primeira grande derrota em campanha sindical, desde que passara a residir no “Morada das Palmeiras”. Estava, enfim, des-mo-ra-li-za-do!
Sem o posto, vítima de chacotas, amargando a solidão da popularidade, o pobre e inútil coronel tombou. Encostou os coturnos.
A cerimônia fúnebre se deu no salão de festas do condomínio. As senhoras rezavam pela alma daquele pecador que, apenas em seus últimos tempos, seduzido foi pelo mundano. A filha era, de fato, a única a dispensá-lo o pranto sincero. Foi quando o absurdo se deu: ao jogar-se com uma coroa de flores sobre o corpo paterno, sabe-se lá como, acionou a dita bombinha e o velho "estandarte", resistindo à morte, apontou ao céu. Abismada e sem saber o que fazer, a filha caiu para trás numa vergonha não apenas tão grande quanto à da plateia feminina que, maquinalmente, batia a desejada continência ao coronel.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

                                      O BAZAR DAS LETRAS

                                   NOTÍCIAS LITERÁRIAS

Por Rinaldo de Fernandes
Incrível como, mesmo com os impasses da educação no país, há gente interessada em literatura. Nesta terça-feira, 25/10, em Fortaleza, no projeto "Bazar das Letras", dei palestra e lancei o livro O Professor de Piano para um auditório praticamente lotado de escritores e leitores de várias idades. A palestra, em forma de bate-papo com o coordenador do projeto, o contista cearense (autor de um primoroso conto intitulado "Perdas e danos", do livro Mundo dos vivos) Carlos Vasconcelos, e, em seguida, com o público (tudo devidamente filmado, para depois ser editado), fluiu muito bem, sobretudo por conta das pessoas ali presentes — como falei, bastante interessadas, atentas. Conheci alguns escritores cearenses que não conhecia. E fiquei feliz com a presença dos amigos Tércia Montenegro e Pedro Salgueiro. No fim, rolou um coquetel e boas conversas. Uma maravilha! Agradeço, além do Carlos Vasconcelos, à (educadíssima) Lúcia Marques, funcionária do SESC, pelo ótimo suporte — não me faltou nada. As coisas feitas com competência e zelo têm tudo pra dar certo! Obrigadão a todos os cearenses que se fizeram presentes no evento! Muito grato mesmo!
"O projeto Bazar das Letras é muito bem organizado, as edições são preparadas com esmero e profissionalismo. O escritor é muito bem recebido pelos organizadores, que lhe dão atenção e ótimas condições de trabalho. E o mais importante: o escritor se sente bastante à vontade na conversa com o apresentador Carlos Vasconcelos, um entrevistador competente, que conduz a entrevista levando em consideração os aspectos mais importantes da trajetória do autor. O bate-papo com o público - aliás, um bom público! - é outro momento importante, um termômetro para o entrevistado, que, ao responder às perguntas, percebe o quanto suas palavras ecoaram positivamente entre os presentes. Tudo que é feito com zelo e competência - e nesse sentido não posso deixar de citar Lúcia Marques, uma das pessoas que estão por trás do projeto - tem tudo para dar certo. O Bazar das Letras é um projeto que está entre os melhores, não só do Ceará, mas do país, e o público que o acompanha pode ser a melhor testemunha do que digo."


Postado por Silas Falcão

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

                                  
                         Navegando contra a corrente



Pedro Salgueiro para o jornal O POVO.


Em termos de tecnologia eu estou sempre, no mínimo, dez anos atrasado. De início reajo da pior maneira possível às mudanças: acho uma droga qualquer aparelho novo que mude algum uso ou costume meu. Sou um sujeito reacionário por natureza, afeito à inércia, e defensor incansável “do mesmo sempre”.

Só mudo à força!

Passa um tempo, e vendo os amigos se deliciarem com um moderno celular ou um “interessante” modo de fazer as coisas, com o novíssimo programa de computador, com um novo... acabo tendo uma curiosidadezinha assim, digamos, sem vergonha. Vou aceitando aos poucos usar as tais novas máquina, a utilizar os inovadores métodos.

Mas reclamando sempre, fazendo cara feia e usando e abusando da má-vontade: uso, pois, à força.

Nunca aprendi a gravar uma fita-cassete, a usar corretamente um aparelho de som. Mesmo depois de anos não sei ainda o botão certo para rodar ou parar o CD, “aumentar o volume é onde mesmo?”, e muito menos ligar e desligar fios na tomada. E botar créditos em celulares é tarefa quase impossível.
Sou um zero à esquerda.

Por conta disso, meus aparelhos são sempre aposentados novíssimos: com quase nenhum uso (e cada vez mais rapidamente) são substituídos por outros com as propaladas novas tecnologias. Não existe mais agulha para o meu velho som Gradiente (mas guardo com carinho alguns discos queridos), junto numa caixa de sapatos as mil fitas Basf e seus usos, modos e atalhos tão lentamente (e com que dificuldades, meu Deus!) aprendidos.

O computador eu utilizo como máquina de datilografar com mais recursos, e mesmo assim com a saudável ajuda de minha filha de 8 anos. Que não raro balança a cabeçinha com mais uma pergunta de socorro.

— Ô pai, você não aprende nunca!?

Não aprendo nem guardo esperanças de aprender. Tenho certeza que serei sempre um sujeito tecnologicamente (mas não somente) atrasado. Irremediavelmente superado.

terça-feira, 25 de outubro de 2011


                                            
        
                                             Outra coisa

Ele, observando a pá veloz do coveiro:
– Quem será enterrado?
– Ninguém.  Este amigo me avisou que está vivo.

Por Silas Falcão
                         

quarta-feira, 19 de outubro de 2011




                                     Ao espírito do tempo

Carlos A. Nóbrega

Que bom te ter de volta, Espírito do Tempo
Admiro-te porque pulsas no pulso erguido de qualquer um
Tu que vens dar nomes próprios às Primaveras
tu que rasga os dinheiros e a certeza
tu que desvia os rumos e a mim mesmo
tu que é estranho brutal e destrutivo
tu que jogamos pedras nos tronos, e incendeiam as catedrais
tu que nutris de medo a ereção covarde dos canhões
            Deixai perplexo o olhar irônico dos fardados
tu que vens sempre sem ser chamado
tu que te acende
quando se pensa que a vida humana é só patinhar nas cinzas do passado
           Revira as tripas dos mandões
ó Espírito Irresponsável Que Só Sente
Sede bem vindo
porque tu me exproprias do meu mau conforto
Eu te saúdo
porque extirpas de mim os dias mal acostumados
            a dizer que sim
A ti empresto o meu suor e minhas palavras de desordem
A ti, ó instintiva, inevitável ecdise da nossa espécie.

sábado, 15 de outubro de 2011


                                          ENVELHERCER

Pedro Salgueiro para O Povo

Deus (ou a natureza, ou seja lá no/em que ou quem acreditemos) nos dá a sabedoria de irmos vivendo sem pensar muito no nosso inevitável envelhecimento. Na verdade não nos preparamos para essa complicada fase da vida (hoje tão eufemisticamente nomeada). Vamos indo rio abaixo (ou acima, quem sabe?) meio que ao sabor da corrente e do vento. Às vezes de canoa, outras no duro nado de peito. Mas verdade que dia menos noite nos deparamos com a “idade” chegando: uma dorzinha nas costas, um porre que demora mais do que de costume a passar, aquela torção de tornozelo que se curava por si dois dias depois do joguinho de futebol e que agora nos maltrata por meses.

Os males físicos são os mais fáceis de detectar, pois inevitavelmente nos procurarão em nossa própria casa; os mentais, não, são mais discretos e nos cercam de longe, infiltra-se em nossos cotidianos sem deixar pegadas. Vão sorrateiramente invadindo e tomando conta da nossa alma.

Um amigo me segreda que morre de medo de envelhecer como seu pai, que foi ficando com o passar do tempo extremamente “gabola”, mudando sua personalidade a tal ponto que causava incômodo nos familiares e amigos: vivia a se “pabular”, que era o melhor escritor de sua geração, que só ele sabia fazer crítica literária, que criar filhos era com ele mesmo etc. e tal. Havia se tornado, aos poucos, um senil “Super Homem” do auto-elogio gratuito, envergonhando os mais próximos, afastando-os de sua convivência.

Já um colega de trabalho, corre célere rumo ao túmulo com uma raiva imensa dos mais jovens, tempo nenhum presta que não o dele, lá para trás. Os jovens, esses são uns irresponsáveis, superficiais e complicados. Nenhum presta, se um novato e mais apessoado funcionário vem trabalha em seu mesmo setor logo se tornará seu inimigo mortal. Que não sabe redigir uma petição, que pensa que é só te rum sorriso nos lábios, no meu tampo...

Mas há quem procure envelhecer com inteligência e bom humor, com a altivez casada com a humildade. Sem essa quase inevitável inveja que sente dos que vêm depois de sua geração com toda força e viço.

Uma ciência complicada, essa do envelhecer com dignidade. E que tribo escassa essa dos que sabem das minguadas vantagens e a elas dê um peso justo, dos que também consigam mensurar as inúmeras desvantagens e, com arte, minimizá-las com resignação e alegria (ou até mesmo ironia)... Dos que vêem os mais jovens menos como um inimigo e mais como os aliados que ficarão, sim, com os “louros” mas principalmente com a inglória tarefa de levar nas costa este nosso pesado, velho e complicado mundo.   

           Sob o Prisma da Enganação
                 (Momento V de SÍNTESE DE UM PENSAMENTO)


Apresentação de Bernivaldo Carneiro


“Bons dias! Hão de reconhecer que sou bem-criado. Podia entrar aqui, chapéu à banda, e ir logo dizendo o que me parecesse; depois ia-me embora, para voltar na outra semana. Mas, não senhor; chego à porta, e o meu primeiro cuidado é dar-lhe os bons dias” — bem, assim iniciou Machado o livro: Bons Dias & Notas Semanais.

Eu, por minha vez, não direi dos outros “Bons dias” de Francisco Lima Freitas ao ir ter comigo em meu trabalho. Senão do seu, “Bons dias” de uma modorrenta e abafada manhã do último mês de março; ocasião em que ele, de inopino encheu-me de regozijo e orgulho. Não escondo que eu me admitia figurar em sua estima, mas daí a imaginar ser um dia intimado a lhe prefaciar um livro ia uma grande distância. Afinal, inobstante remonte há doze anos a minha ousadia de enveredar pela escrita, até um triênio atrás eu sequer vislumbrava a possibilidade de vir a ser acolhido no ninho literário cearense. É que, por índole, acanhado e ainda exercendo uma profissão voltada às ciências exatas, a minha rotina me afastava naturalmente de tal gueto.

Mas o Presidente tem a faculdade de me varrer os escrúpulos da timidez e, independentemente da “diplomática pressão” antes anunciada, estou eu aqui de alvedrio.

O escritor e jornalista Lima Freitas, mais que um intelectual que goza do respeito e reconhecimento do meio cultural alencarino, é antes de tudo um caráter extremamente modesto e uma voz de prontidão contra as injustiças do mundo. Um eloquente defensor dos princípios que defende e um contumaz crítico das imprecações que condena. E o que é melhor: com a firme consciência de que reside no temor a Deus a origem da sabedoria.

Nascido em Capistrano, Ceará, há dezesseis anos representa o seu Torrão Natal na Academia de Letras dos municípios do Estado do Ceará – ALMECE. Silogeu do qual é presidente desde 1996. E como tal, relevando a fadiga dos anos sem revelar o cansaço do dia-a-dia, dedica seu cotidiano integralmente à cultura cearense.

Sob o Prisma da Enganação (Momento V de SÍNTESE DE UM PENSAMENTO) o quinto de sua lavra, na verdade é um livro composto por uma coletânea de preciosas crônicas e primorosos pronunciamentos. Alguns, inéditos; outros já veiculados nos meios editoriais da Arcádia que preside e de algumas das muitas entidades culturais em que tem assento. Por assim dizer, uma obra que tem a fisionomia do autor e, como tal, merecedora de nossos melhores aplausos; posto que fora artesanalmente composta com o inconfundível estilo Lima Freitas: culto e elegante.

Há quem entenda os textos rebuscados e férteis em termos inusuais (especiosos para alguns) como uma premeditada intenção de impressionar, onde o desejo de exibir cultura está acima do intuito de transmitir conhecimento. O que evidentemente não é o caso de Lima Freitas neste livro. Por natureza: afeito aos adornos da fala e aos ornamentos da escrita, o autor em comento é antes de tudo um palmeado Retor Padrão da Academia Cearense de Retórica — ACERE. De modo que, se ele foge da linguagem coloquial (o que a princípio sugere afastar o leitor do escritor) é porque, praticamente todos os textos constantes deste tomo, foram concebidos com a pena das demandas acadêmicas, e, como tal, o público alvo é culto e exigente.

A propósito, com todo o respeito e admiração que tributo ao maior escritor argentino de todos os tempos, que posição eu devo ter ante um Borges “orgulhoso de nunca ter escrito uma palavra difícil que levasse o leitor ao dicionário”; senão questionar: é ou não é um dos propósitos do leitor, o enriquecimento do próprio vocabulário?

De forma que vejo este livro de Lima Freitas como uma obra que os sábios leitores e a provecta e sisuda crítica saberão dar-lhe o merecido valor. Siga, pois, caro Lima Freitas sem se importar com o tempo, o seu dia-a-dia de completa dedicação à cultura e em especial às letras. Pois, esteja certo de que os doces frutos que as gerações futuras colherão, no mínimo, neutralizarão o amargo que hoje se experimenta ao semear cultura em tão inóspito e árido solo.


terça-feira, 11 de outubro de 2011

                        (Foto de Francisco Viana, jornal O POVO) 

                                    Sânzio de Azevedo de Gaveta


Por Pedro Salgueiro
Conheço Sânzio de Azevedo desde a década de 90 do século passado. Vi-o pela primeira vez no lançamento do livro Moreira Campos em quadrinhos, organizado pelo mestre Geraldo Jesuíno, no salão nobre da reitoria da UFC. Trocamos conversas e livros e vamos construindo uma amizade que espero seja para sempre.
Tenho aprendido muito com este que considero o "maior conhecedor da literatura cearense e arredores", e nos falamos quase todos os dias, não só de literatura, mas sobre quase tudo; só temos evitado falar ultimamente de política, devido a já termos discutido feio algumas vezes, mas nada que alguns dias de silêncio não tenham curado.

Difícil conversar com ele e não ouvir algumas expressões bem “suas”: “Cortar a casaca da humanidade”, “A puridade”, “Mandraque” e tantas outras, que sempre saem de sua boca acompanhada de uma gargalhada meio contida porém sincera.

Palestrante sem igual, discorre sobre seus assuntos preferidos com segurança, mas principalmente com um humor bem característico e, acima de tudo, inteligente.

De tanto se destacar como historiador e crítico literário foi restando quase desconhecido como poeta e contista, gêneros que vai levando de forma subterrânea e constante pela vida afora.

Três livros de poesias editados e um volume de contos inéditos (alguns já publicados em revistas e suplementos) passam quase desapercebidos até mesmo dos amigos mais próximos.

Em homenagem a esse “Sânzio de Azevedo de gaveta” quero apresentar a vocês o poema dele de que mais gosto (outro dia trago um conto):


SONETO I

O papagaio traz no bico a sorte
do transeunte da cidade grande;
dragões de ferro andam semeando a morte
mas o realejo em música se expande.
Fanhoso, ele renasce a velha valsa
que sobe com o barulho da avenida.
Juntas as duas se afigura falsa
alguma delas na manhã perdida...
Saias-balão, casacas e cartolas
misturam-se aos “blue-jeans” e minissaias;
gemem sirenas, rangem grafonolas,
cresce o edifício em meio às samambaias.
        Rugem motores de hoje antigamente
        ou cantam flautas de ontem no presente?

                 Sânzio de Azevedo. Cantos da Antevéspera (1999).


O SEGUNDO PENSAMENTO
(Poesia e Prosa)

Por Silas Falcão

De porteira aberta e com muito empenho, acolhi os exemplares do Sertanejo, Oh!xente, livro de estria do conterrâneo Edmilson Providência. Há anos não reencontrava o Edmilson, mas a literatura tem magias, ímãs e facetas benévolas. Após o lançamento, no Teatro Rosa Moraes, dos livros Açucena não é flor que se cheire; Histórias de roça: ciranda, cirandinha, venham monstros cirandar, respectivamente de Lourival Mourão Veras e Elias de França, estávamos eu, Pedro Salgueiro, Bernivaldo Carneiro e Luciano Bonfim numa pizzaria vizinha à Praça da Matriz de Crateús, quando Edmilson ressurge de um passado distante, nos cumprimentando.Rapidamente literatura e livros pertenceram ao cardápio. E nos convidou: “brevemente lançarei meu livro”. E hoje estou lançando o meu Oh! xente ao interpretar e não julgar as poesias e prosas do amigo Edmilson, sempre empilhando nas ancoretas da sua alma novas providências.
Livro à mão e sentindo o cheiro de papel novo, inicialmente desempenhei uma panorâmica. Li os títulos dos capítulos e dos textos. Sobrevoei capa e contracapa. Levitei segundos em alguns parágrafos e frases e ouvi rapidamente as faixas do CD. Todo este “aéreo” foi para sentir o livro e me aproximar mentalmente do poeta. Passo a passo comecei a leitura/viagem me sentindo em casa de minha antiga morada, sob um arejado alpendre com redes estendidas, ouvindo o balançar das conversas de ganhos e perdas, e causos de secas e invernos no sertão.  
Não serei júri literário, pois tenho muito, muito que aprender sobre literatura e produção textual, mas elaborarei, prazerosamente, o meu ato de interpretação em parágrafos que serão os meus capítulos. Mas antes, o meu isto: uma realidade jamais será linearmente julgada a partir de duas pessoas. Sempre me conduzo com a verdade de que não vemos a vida como ela é, mas como somos. Não li o livro, mas comentários sobre Obra aberta (1962), de Umberto Eco que observa: “o autor escreve, mas não termina porque o leitor é coadjuvante na elaboração do livro”. Quando lemos um livro, o conteúdo da interpretação – a segunda elaboração – será consequência da visão de mundo do leitor, neste caso eu. Interpretar uma produção literária de alguém é uma atitude mental distinta e cuidadosa, pois não falamos unicamente sobre a sua literatura, mas da percepção dele sobre a realidade – objeto da literatura –que o cerca e como ele manuseia as palavras na elaboração textual. Então, não interpretaremos somente o escritor, mas o conjunto pessoa/escrita.
Sertanejo, oh! xente” é a poesia anfitriã de oito estrofes alternadas em tercetos e quartetos com rimas dispersas. Ao longo da narrativa com diversidade de sons e movimentos – “balançando o juazeiro/no vento que vem e vai”; “terra... onde canta o patativa/bentivi e o azulão”; “Nessa terra... o forró é a toada...”, – Edmilson (re)canta o vigor do caráter, a obstinação e a esperança do nordestino mesmo sob as lâminas da seca ceifando cores e texturas da paisagem, matam o açude, o verde, as sombras, mas nunca “...a fonte do saber/...o coração.../cheio de amor e de carinho/e de cultura popular”. Esta secular decisão do nordestino em superar lágrimas e espinhos pulverizados pela seca esfomeada, me lança a esta frase que li por aí: “O sol que derrete a cera é o mesmo que seca a argila”.
 Lamento da natureza” é um canto cinzento como a última hora da tarde de domingo em que as alegrias se despedem. Contra a progressiva chacina da natureza, o poeta denuncia os algozes: “...criaturas decadentes/pelo poder da opressão/construindo suas armas/pra fazer destruição/de uma beleza transmutada/após anos de evolução”. Esta poesia reacendeu uma frase autoral que expus em 1981, no Campus da Unifor, enfileirando-se a dezenas de frases universitárias: “a natureza grita a dor da morte. Onde estão as lágrimas dos homens?” Nesta época eu estava de passagem por meus 24 anos, tinha mais sonhos e no mundo existia mais oxigênio. E percebendo as reais possibilidades da autodestruição da humanidade que o poeta Edmilson se revolta com a transformação do oxigênio – a natureza – em carvão.
Boêmia e literatura são como a noite, a lua e as estrelas: indissociáveis e mantêm distância da racionalidade. O boêmio de régua (Edmilson) Providência, em “Tributo a Nelson Gonçalves”, lembra-nos um dos expressivos interpretes da alma boêmia brasileira e lhe dedica eternidade quando poetiza: “seu coração/parou, pois chegou seu dia/mas sua melodia/não morreu...”. Nós boêmios sempre teremos elegantes e educados pensamentos apontados para Nelson Gonçalves.
O olhar crateuense do autor de Coração de Poeta, homenagem ao Dr. João, o recuperador de corações, se expande entre confetes e serpentinas nas poesias “Oh, Crateús”, “Maravilha e Carreteiros”, “Carnaval 2001”, “Carnaval 2004” e “Crateús, terra da alegria”. As dezoito páginas finalizam o capítulo Música, e cantam Crateús enobrecida por sua cultura, literatura, pelas referências culturais de Lucas Evangelista, Mestre Batista, D’Almeida, a teatrólogo Socorrinha, professora Neide Nogueira e os destaques carnavalescos Tykerê, Mandacaru, Maracatu e os blocos alternativos.Os primeiros versos de “Crateús, Terra da Alegria”, reafirmam os desdobramentos poéticos do Edmilson: “Crateús, terra querida/Revestida de beleza/A grandeza do seu povo/Alegre por natureza/; As noites sempre festivas/Mostrando rara beleza/A grandeza do seu povo/Alegre por natureza.
No capítulo Poesias, mesmo o livro sendo poesia e prosa poética, com exceção de alguns anexos, percorri ruas imaginando quais seriam nossas reações diante da “Revolta do Lixo”. Criativo e consciente foi o poeta lançando a ideia da personificação do lixo observada nas ilustrações da página 61, onde deveria haver frases nos cartazes, enriquecendo a qualidade visual e de conteúdo da manifestação. Mas este detalhe não dissolve a proposta do autor que é despertar consciências de que lixo é uma consequência da cadeia produtiva do capitalismo e que sua permanência pública é uma suja criação da nossa irresponsabilidade. 
Inesquecíveis são as frases imbricadas harmoniosamente à nossa estrutura mental, alongando nossos pensamentos. Uma destas é de Victor Hugo: “a alma da terra passa para o homem”. Nos dias iniciais de setembro eu e amigos estávamos numa Fazenda participando dos 83 do pai de outro amigo. Homenageando o aniversariante, uma cantoria com Louro Branco e Zé Cardoso se espalhou no terreiro ganhando o infinito da noite no galope do vento. Da mesa sob as estrelas, observei as paisagens humanas nativas dos lugarejos adjacentes. E olhando olhares, sorrisos e andares, recordei essa frase. As pessoas traziam nas alegrias, nas gesticulações, nas palavras, no andar, nos olhos e roupas a alma da terra em que nasceram e vivem. A poesia “Fortaleza” ratifica o enraizamento humano à terra da sua existência, do seu cotidiano, dos amigos e da sua família. Edmilson, em visita à Fortaleza, se indispôs com a imagem urbana ao ver “gente correndo pra todo lado... Mas pra que tanta correria/se o tempo não volta atrás”.
Colho dos filtros mentais do Edmilson um apadrinhamento de fogueira com a homenagem a quem verdadeiramente merece, tornando pública a identidade cultural, moral, filantrópica dos homenageados. E honrar a literatura eternizando pessoas e suas atitudes humanas neste livro é uma opção digna e justa com aqueles que fazem de sua passagem neste planeta passos de valorização da vida para com o próximo, a exemplo de D. Delite , D. Rosa Moraes e Seu Ferreirinha.

A leitura final começa nos Anexos, capítulo ordenado de crônicas em 3ª pessoa, excetuando-se o anexo 13, do Grande Heitor Maravilha, em que ele – 1ª pessoa – narra a origem do bloco alternativo Maravilha e Carreteiros. O final deste meu ato de interpretação será honrado com as presenças das pessoas que desenvolveram a educação e a cultura de nossa cidade. Inicio com a bela crônica – anexo 3 – Ferreirinha, o humanista, do poeta Lourival Mourão Veras. Li a primeira vez no blog da Academia de Letras de Crateús – ALC – e reli vezes observando o seu agradabilíssimo estilo literário. Mas antes, o que é cidade?  Conceito de Lana Cavalcanti: “Cidade é uma aglomeração de pessoas (habitantes, visitantes) e de objetos (edifícios, casas, ruas). Em função dessas pessoas e desses objetos os espaços e a vida urbana se organizam. Tendo isso em mente, podemos estudar a cidade como uma paisagem de objetos, sons, odores, pessoas e seus movimentos”. Mas o meu objetivo é ver/sentir a cidade como um lugar em que as pessoas produzem cotidianamente VIDAS. Como um lugar da familiaridade, afetividade, conectividade, diversidade. Superior a hierarquias de conceitos, cidade são PESSOAS. São elas que constroem, esculpem a paisagem humana da cidade. E o poeta Edmilson aplicou a acuidade habitando seu livro com pessoas que criaram e desenvolveram portfólios culturais e humanísticos em Crateús. E uma destas é Ferreirinha. Nonagenário Senhor de muitas leituras, memorialista da história de Crateús, cronista, radialista, militante partidário. Noberto Ferreira Filho, imortal da cadeira nº 1 da ALC, é nome de Biblioteca em Crateús. Menino eu ouvia falar do Ferreirinha comunista. Dele implantaram-me grandes medos como mais um papa-criançinhas que a Igreja e a ditadura militar inventaram. Hoje o amedrontamento cedeu à admiração a um HOMEM de caráter que tem amor a vida e as pessoas.

Anexo 4 de recordações.  Contemplações. Agradecimentos. Reverências vitalícias a uma das maiores educadoras de Crateús e do Ceará: Maria Delite Menezes Teixeira. A Dona Delite. A nossa mente pratica memórias voluntárias e involuntárias. Ler Dona Delite, involuntariamente me ocorre o inesquecível e pioneiro Externato, honra e glória da nossa cidade e da Rua da Cruz, espaço da minha infância e adolescência. Recentemente li no blog da ALC a bela crônica “Uma fábrica de sonho”, do poeta Raimundo Cândido, filho Dela. Aquecia Crateús o sol do meio-dia acompanhando centenas de estudantes para único destino: Externato Nossa Senhora de Fátima. Lembro-me das fileiras de alunos aguardando o chamado do sino para entrar na maravilhosa Fábrica e trabalhar os sonhos. Como todos os sonhos valorosos, estes não eram fáceis de realizar. Muita aplicação na tabuada. Leituras e leituras do insultante e volumoso Livro de Admissão. Todos os erros de aprendizagem e de comportamento, para não macularem a fabricação, a realização dos sonhos e o funcionamento da Fábrica, eram castigados com palmatória e/ou com permanência em sala de aula ao termino desta. Sofri os dois, muitas vezes sentindo as garras da fome arranhando a lousa do meu estômago. Externato Nossa Senhora de Fátima de onde sempre escuto as vozes adolescentes trabalhando! Quando em Crateús, visito a Fábrica dos meus primeiros sonhos. No http://www.crateus.ce.gov.br/ ouviremos a riquíssima entrevista de Dona Delite, dialogando com lucidez de juventude. Hoje, 11 de outubro, foram postados no site 479 comentários dos ex-alunos espalhados pelo Brasil. E todos são unânimes que a Grande Mestra seja homenageada com o Título de Cidadã, que será concedido no dia 14 deste mês, na Câmara Municipal de Crateús. Dona Delite MERECE. E sempre será amada pelos crateuenses.
Outra riqueza humana, no anexo 5: Rosa Moraes. Reincidência da memória involuntária: Colégio Pio XII. Anos 1970. Os alunos esperavam em frente ao velho portão. Sob as frias manhãs na Rua Firmino Rosa, uma respeitável Rosa alta, volumosa, caminhava em direção ao estreito portão de ferro que se abria a Sua passagem. Rosa Ferreira de Moraes fez este percurso por 37 anos. Fui aluno Dela. Também de artes plásticas, mesmo por algumas horas/aulas. Recordo um dia em que Ela convidou o Dr. Sales para narrar suas conquistas de vida. A plateia de jovens se despindo da adolescência ouvia imóvel a voz experiente, elegante e vitoriosa. Certamente a Professora queria nos dizer, por uma testemunha respeitável, que a vida é possível. Quando o volumoso som do sino anunciava a última aula do semestre, Ela abraçava fortemente cada aluno, sem distinção de molecagem ou inteligência. Julho deste ano, eu estava no Teatro Rosa Moraes para posse de novos acadêmicos. Deram-me, pela sequência de propostas enviadas a secretaria da Academia de Letras de Crateús, a cadeira nº 23. Convidei o saudoso e grande cronista Milton Dias para sentar-se como meu patrono. Nunca esquecerei esse momento. Abro um parêntese para agradecer ao poeta/irmão Raimundo Cândido Filho, que apadrinhou minha indicação e todos os acadêmicos. Pois bem. Dos anos 1970 a 2011, luas olhei, sorrisos encontrei, abraços inaugurais e finais pratiquei, pores de sol contemplei, objetividades espantei. E a Rosa? Nunca mais A vi. Quando a cerimonialista da ALC iniciou o final da solenidade, uma Bela paisagem humana cintilou entre o público.  Reolhei. Era a Rosa. Nonagenária. Não duvidei e comandei ordens ao meu lirismo: foto. Sempre retorno à fotografia. A Professora Rosa Moraes ao meu lado, olhando para as lentes do fotógrafo. Para mim. E eu para Ela.

Anexo 7: Manoel Picolé. Eu criança o vi saindo da sua casa, em frente ao cemitério, com o seu original bloco Às de Espada. Manoel Picolé é o morto ressuscitado pelo Edmilson.  

Rio Poti na página 135. Neste anexo, do memorizador dos fatos e pessoas da nossa terra Flávio Machado, eu nadarei um pouco.Trago em minhas memórias voluntárias, as águas deste Rio da década de 1970. O inverno teimoso alongava a sua trajetória em direção às residências da Rua da Cruz e aos medos humanos. Criança indiferente aos truques do rio, eu mergulhava em suas águas barrentas. O tempo escorreu. E sempre encontramos novas maneiras de errar. Hoje, o Rio da minha infância arqueja como sobrevivente de uma seca gorda, de uma tortura cruel. Vai-se evaporando pela ação do crescimento da cidade e da mesquinhez do progresso. Meu Rio Poti! Da década de 1970!      

No desenvolvimento do meu ato de interpretação, me senti personagem oculta de várias poesias, músicas, prosas e anexos. Por este motivo me espichei na maioria dos meus capítulos, sempre metendo o bedelho do meu passado. Tentei criar cercados aos meus pensamentos e atitudes para que eu me restringisse somente a alguns textos da escrita social, política e literária do poeta. Mas foi impossível porque Edmilson não lançou um livro, mas o livro das memórias crateuenses e familiares, estas evidenciadas nas prosas “Minhas folhas”, dedicada as filhas Lívia e Laís, e “Tome uma Providência, uma relembrança (etílica) de quando ele produzia aguardente de cana na fazenda Zeca Lopes. Sertanejo oh! Xente não é um livro impecável. Apresenta algumas falhas técnicas – o sertanejo na capa poderia ser substituído pela imagem do chapéu que está no CD. Ficaria mais subjetiva e com mais arte – e de estruturas textuais. Mas esses ciscos JAMAIS apagarão o autor e sua obra. Após a leitura do livro reouvi o CD. E como a música soma qualidades ao que se escreve!  Das oito faixas, me agradou muito Sertanejo oh! xente, Mulher, Tributo à Nelson Gonçalves e Oh, Crateús.

Livro fechado. Cervejinha ao lado, e no balanço da minha rede – literalmente em minha casa – fiquei matutando a vida e as pessoas. Todo dia lemos as pluralidades do mundo e seus elementos acrescentados. E registramos pessoas sem a consciência de que a vida é acolhimento. Acolhimento de atitude de paz. Acolhimento do sorriso amigo. Acolhimento da boa razão. Acolhimento do erro cometido. Acolhimento das leituras renovando as qualidades das nossas emoções, pensamentos e nossas vidas. Acolhimento do conselho justo e perfeito. Acolhimento das verdades que nos tornam mais humanos e mais válidos. Acolhimento da prudência. Acolhimento da paciência. Acolhimento da flexibilidade. Acolhimento da sensibilidade. A VIDA É ACOLHIMENTO. E rematutei Edmilson: enquanto milhões de seres (h)umanos divulgam/praticam a violência, a morte, o sangue e a dor, ou seja, o desacolhimento, o Edmilson compartilha com o público os seus acolhimentos de saudades, acolhimentos de justiça, união, paz. Acolhimentos de valorização do ser humano. O poeta nos presenteou ACOLHIMENTOS enfeixados nas 140 páginas do seu livro. Incluo os Anexos, mesmo não sendo autorais, que são acolhimentos– centenário de Crateús, Carnafolia, Mestre Lucas Evangelista, Maria do Socorro Malveira Silveira, Tikerê, João Martins de Sousa Torres – escritos por autores diversos.

Um amigo criou Meus livros dos outros, blog de resenhas. Desnecessário falar que meus livros dos outros são seus empáticos literários. Devemos considerar Sertanejo, oh! xente, pelo que ele representa de memórias, homenagens e fonte de pesquisas de algumas linguagens culturais de Crateús, como Nosso livro do Edmilson.

O título O Segundo pensamento surgiu desta verdade: literatura não é reprodução da realidade, mas um comentário, uma postura, um ponto de vista do autor do que ele observa ao redor. Reinterpretar literariamente essa realidade exigirá a mediação do autor – o observante – que usará outras argumentações, que é o segundo pensamento.

Final de leitura que iniciei sem saber que estaria numa espécie de caça ao tesouro. E nos mapas de pessoas, amigos, saudades, lugares, depoimentos, carnavais  
Encontrei-me.