A Poesia de Márcia Lio Magalhães
Fim de tarde, silêncio de um sol brando
eu me volto para minha interioridade. Entrego-me à reflexão para falar de poesia
— gênero que não domino. Sou um viajante do semiárido brasileiro que nas horas
vagas ousa transitar pela prosa enquanto invejo os poetas. Pois não sou dos
mares, dos céus, dos sonhos; senão um atuante das secas. Um homem da caatinga e
dos cactos (xique-xique, mandacaru, facheiro...), dos juazeiros e assemelhados a
serviço da prospecção de água para dessedentar os sofridos irmãos nordestinos.
Mas depois de ler A Pele Que Habito,
de Márcia Lio Magalhães, não me contive. E assim largado dos meus sóis e de
meus personagens hilários do cotidiano a que assisto e crio, lanço-me neste
abismo azul de substância infinita, a banhar de luz o espírito dos vates.
Arrisco-me nesta resenha penetrando as profundezas das melodias das manhãs de
setembro, das primaveras e seus jardins, dos invernos frios de solidão, dos
outonos das árvores cobertas de folhas que esmaecem e caem no encantado chão de
Márcia Lio.
A Pele Que Habito é uma obra eivada de
sentimento, extensão e fluidez; intrínseca do corpo que fala desnudando por
completo a alma da autora. Tecida por palavras mágicas e sonoras que transbordam
amor a revelar seus mistérios. Colhi nos versos de Márcia um enfoque social e
humano, onde há compaixão: o conhecimento da dor alheia. Vi no amor dos amantes
esta força infinita que rege o mundo em sua mais ampla dimensão. Assim como detectei
a coragem das emoções vivenciadas nas esperanças da conduta humana. E mais: o
antagonismo entre o prazer e a dor no trânsito da saudade; a angústia colocando
o homem diante de si mesmo enquanto ser cósmico que o é a compreender sua
existência; o amor acompanhado de excitação e desejo. É que no domínio de seus
versos a autora confere, decodifica, interpreta e analisa o afeto em todos os
sentidos. Faz, com extrema sensibilidade, sua arte fluir entre o criador e a criatura,
numa atividade lúdica a nos revelar o romantismo de um olhar atento,
expressivo, fascinante do particular modo de se expressar. Lembro Fernando
Pessoa: “A espantosa realidade das coisas é a sua descoberta de todos os dias”.
Através do mundo poético a autora se
veste de poesia fazendo dela sua própria pele. Um poder que só a poesia o tem.
Márcia nos convida a mergulhar em suas fronteiras de brancas brumas, a velejar
em arco-íris melodioso, a voltar o olhar para várias regiões contempladas pelo
coração. Tudo elaborado como prova da luz e da razão que nela brotam.
Parabenizo Márcia Lio por A Pele Que Habito erguendo um brinde e
convidando o leitor a beber deste cálice transbordante de encantadores versos.
Bernivaldo Carneiro
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