sábado, 14 de junho de 2014



Bernivaldo Carneiro

Enquanto o Selecionado Canarinho não me impõe segurança, que tal relembrarmos o Penta? E para não cansar meus leitores (uma legião, que tão diminuta eu os conto numa só mão) farei em dois tempos. Não sem antes dizer que esta Copa está me transformando num cidadão bipolar. Explico: sempre que analiso e comparo nossa Seleção com as concorrentes, minha autoestima oscila ao sabor do vento. Por vezes, de tão alta, sinto-me um argentino; mas logo despenca e sou visitado pela síndrome de vira-lata. Meu conforto nestas horas é relembrar o país e o ano em que vim ao mundo, e ouvir o que Nelson Rodrigues disse a esse respeito: “Os brasileiros nascidos na década de 1950 são tão humildes que se escondem da carrocinha”.
Enfim, de dedos cruzados e a debulhar o rosário para que neste Mundial sejamos abençoados pelos ventos da sorte que nos bafejaram em 2002, vamos ao prometido.


Assim foi o Penta
= primeiro tempo =

Se nas rádios não restava alternativa, o que dizer dos canais de televisão? Sobravam apenas as novelas e os chatos Realities shows. Os telejonais tinham se transformado em programas esportivos que se cercavam de tudo que era possível para, senão incrementar, pelo menos segurar a audiência. Quem desconfiava de que bola de futebol é um objeto esférico (tudo bem, vá lá que seja redonda), logo era admitido como analista esportivo. Estapafúrdios eram os comentários e as considerações, prosaicos e bizarros os palpites, bisonhas e ridículas as sugestões.

Com justiça, os ainda viventes de seleções anteriores, também foram convocados. O Rei, por exemplo, não poderia e faltar e não ficou de fora — apesar de o Felipão considerá-lo “Um bola fora em táticas futebolísticas e prognósticos de Copas do Mundo’’. Chegou a ser cruel com o melhor do mundo de todos os tempos: “A receita para a vitória é ouvir o Pelé e fazer o contrário. As suas análises sobre futebol não valem absolutamente nada” — fechou questão o enjoado Felipe Scolari.

Pensando bem o Rei deu uma de plebeu ao vociferar suas previsões derrotistas. E o que dizer dos comentaristas de plantão? A maioria inapta para o ofício cuspia verborreia e soprava tolices que incomodavam até os mais surdos dos ouvidos.

Referindo-se às concorrentes consideradas babas, nosso metafórico treinador criou a figura dos “Bambalas e Arimateias”. Um analista em formato de rolha de poço (baixinho e gordo, entroncado e sem pescoço), que não era um dos piores, pegou carona e os denominou “Filhotes de cobra d’água com jacaré”. Eu, um peladeiro sem nenhum recurso técnico para a arte, do alto de minhas pernas de pau não os diria babas; sem tradição, talvez. Afinal, exatamente as equipes menosprezada chutaram muitos figurões para escanteio. Mas, o importante é que os comandados do turrão Luís Felipe, abençoados com generosas doses de sorte, mandaram bem. Contamos com uma mãozinha do árbitro logo no primeiro jogo e seguimos embalados pela melodiosa Deixe a vida me levar, do talentoso Zeca Pagodinho. O quarto poder adotou e quis impor como trilha sonora de “Nossa Canarinho”: A festa, na voz da não menos qualificada e sortida de notáveis predicativos femininos — Ivete Sangalo. Mas a dita “Família Scolari” tinha lá suas convicções.

No tocante ao prematuro Adieu, le blues nada deve ser creditado a nós; o que não me impede de tirar uma casquinha: que papelão, hein França! Apenas um ponto ganho em três jogos e nem um gol marcado! Também não nos cabe a honra de ter sido mandada de volta, ainda na primeira fase, a Argentina do irrequieto Marcelo El Loco Bielsa. Fazendo parte da denominada “Chave da Morte” os platinos sin plata tiveram vida curta. O que seria a panaceia para o caos sócio-econômico portenho, transformou-se em efeito colateral. Apesar de bastante senhores de si, los hermanos sofreram um acachapante baque em sua estratosférica autoestima. Bem feito. Coisas da Providência Divina. Quem os mandou, a exemplo dos franceses, fazer pouco caso da seleção brasileira? Os deuses do futebol não gostam de “Chuteira alta”. Não toleram a soberba, não admitem empáfia, não curtem arrogância.

Destino idêntico teve o Uruguai de Recoba. Os patrícios de Luís Figo, idem. Também sem um único Antônio, nenhum Manuel e um monte de Joaquins no escrete, os lusitanos não poderiam mesmo ir longe! A saudade de Trás-os-Montes nem teve tempo de se instalar. E já que o tema são os patrícios... Como se não houvesse tal suplemento alimentar em sua dieta, o anêmico Figo se cansou de levar ferro nos gramados asiáticos. Este gajo, que aos olhos míopes da FIFA (nunca aos meus) era o melhor do mundo, ficou muito mal na fita. E o que dizer do goleiro português? Pobre guarda-redes, depois de interceptar alguns pontapés de canto, não conseguiu segurar o esférico chutado pela Coreia. Inconsolável, desnudou-se da camisola e, aos prantos, deixou o relvado para, junto aos também inconformados parceiros, encarar a grande bicha no aeroporto. Voar de volta à terrinha foi o que lhes restou.



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