POETAS DE QUINTA
Carlos Vazconcelos
Poetas de quinta-feira,
de quinta categoria,
o que a cidade oferece,
o que pede, poesia?
São esquisitices do óbvio
que se buscam em segredo,
talvez ópio ou cronópio
que nos distraia, brinquedo.
Enquanto somos atores
deste palco, oito paredes,
por quem somos, não sabemos,
cruz vermelha, facção verde?
Há inimigos à espreita!
Mas também o quanto sou?
Cada um carrega em si
o peso do morto ou
um espantalho sedento
com um coração tamanho,
indeciso entre a angústia
a melancolia ou o sonho.
Sem honraria ou medalha
que o valha, a poesia
servida fria é navalha
que talha a demagogia.
Meia-tigela de versos
vale mais que um teorema,
do que o dinheiro-dejeto
de tão precário sistema.
O que a cidade oferece,
o que pede, poesia?
Devaneios e delírios,
desamores e anarquia?
Nada disso sobrevive
às garras da irreverência
satirizando, seu moço,
o mundo, resiliência.
Poetas de quinta-feira,
de quinta categoria,
sois passageiros de cúmulos,
sois uma idiossincrasia?
Uma usina de nada?
Poços de sabedoria?
Concerto número único?
Bússola sem seta-guia?
Dez cavaleiros de triste
figura e uma dulcineia.
Sois vós de meia-pataca?
Sois vós de tigela e meia?
De nada vale o dilema:
Se a vida está por um triz,
“Monte parnaso” é no Eusébio
“Pasárgada” é o Bar do Assis;
há de haver outros “olimpos:”
o Tronco do Sapoti,
Bar do Pancho, o Animaw,
certa casa no Fortim...
Poetas de quinta-feira,
palindrômica utopia,
lançar minutas do caos,
nos ultramundos seria
maneira de registrar
nossa passagem no mundo,
de navegar, mergulhar,
em mares tão foribundos.
Poetas, acangapebas
bastam umas cervas geladas,
coca-cola, carne assada,
e cadeiras nas calçadas.
Não existe protocolo
nem brasão ou livro-ata,
o fardão é uma pilhéria,
a divisa é uma bravata.
Há coisas mais importantes
advindas do imaginário:
Os vendedores de Judas...
restos de corpo no aquário...
Um breviário completo
e receita tão excêntrica
contra o princípio copérnico,
lógicaherméticautêntica.
Um muzungu africano,
um cabra do limoeiro,
outro lá dos Crateús
são mais três dos cavaleiros
a aliterar seus versos
em noite de manequins,
quem tomar banho por dentro
molha o cérebro e os rins.
Sob a lança de Nzambi
criou-se uma nova moda:
sair dançando assim
com sapatos que incomodam.
Uma estranha galeria
de tipos desengonçados
que habitam o mundo dos vivos
as noites e os dias roubados.
Nessa divina comédia,
Papaconha e Amhitar,
Dom Quixote e Bode Ioiô
terminam por se encontrar.
Repito, é mais importante,
acreditai, não invento:
Faltem-nos dantes, cervantes
Mas nunca moinhos de vento.
7 comentários:
Quando eu digo que o menino é bom é porque ele é realmente notável. Um talento multifacetado que vai da prosa (conto, romance, crônica e tudo mais) à poesia. Eu, lisonjeado por ter sido generosamente citado no poema em comento, orgulho-me de pertencer a um grupo cheio de valorosos literatos como o nosso Vaz. Concordo com o PSal e com quem mais defende que a obra em tela seja o prefácio, ou coisa que o valha, do primeiro livro dos PdeQ.
Abraços.
Bernivaldo Carneiro.
Que poema do caralho!!!
Será o prefácio do nosso livro!
Muito bom! Muito bom!
Parabéns a todos nós e ao talento do Vaz!
Frederico Régis
Pessoal, que se musiquem estes versos e que deles se faça nosso hino!
Grande Carlos Vazconcelos!
Um fraternal abraço.
Manuel Casqueiro
Carlos, os poetas podemos ser de quinta - mas seu poema é de primeira
Alves Aquino (O Poeta de Meia-Tigela)
Você, hem, inspiradíssimo Xará! Belíssima escritura. Cada um de nós deveria colocar este texto num quadro e pendurar em nosso quarto de dormir. . . Ah, vi você em cadeia nacional, entrevistado na Rede Brasil de Televisão no Festival de Parati. Fiquei todo ancho.
Abraço gigante
Carlos Nóbrega
Carlos, parabéns pelo poema e pela imortalidade serrana!
Paulo Avelino
Caramba, Carvaz, muito bom, Véi...
Quando é a próxima celveija?...
Eugênio Leandro
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