segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

                     
                                    


A última cabra


 
Carlos Nóbrega

                                      
                                                      
Desde quando o sol é mundo
o sertão arde. São 3 h da tarde
E é tarde.
Uma família arrodeada de nada
não espera mais sob o azul sem sombra,
o azul profundo que não chega ao poço:
Nada chega ao poço.

As nuvens se retiram como o milharal se retirou.
Uma cabra se lembra da água
em sua própria boca.
A família a espreita,

e o tempo é comprido
como um dia de fome.

sábado, 9 de fevereiro de 2013


                                          TÚNEL DO TEMPO
Por Silas Falcão
Primeira comunhão. Sou o da direita. Tinha oito anos. Foram meses de preparação. Lembro-me da Mamon, velha senhora professora de catecismo. O da esquerda é meu irmão. Essa festa foi há 48 anos. Lembro-me com lucidez desse dia.


                                                             
                                                       Relembranças
Por Silas Falcão
A casa amarela pertencia as Marques, idosas senhoras da década de 70. A casa foi demolida para a construção de um restaurante. Ao lado, a casa onde residiu minha adolescência e juventude. Grandes momentos moraram nessa casa. Enorme era o seu tamanho. Muitas saudades dela. Em 97, meu pai vendeu para a Receita Federal.






                                    Feira do Livro, na Praça do Ferreira- 2012.

Reencontro amigos de infância no estande da Academia de Letras de Crateús. De óculos, Anastácio, o famoso Macarrão e o poeta Raimundo Cândido.   

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013


                                              Poetas, bom dia!
Domingo, dia 10/02, o nosso amigo Bernivaldo Carneiro completará outra idade. Ele estará um pouco mais velho que esta foto, que é da década de 60, do século passado (rsrsrsr). Quem quiser parabenizá-lo e só ligar para 96562101/85064442 ou pelo e-mail bernivaldo@gmail.com

                       “Demócrito Rocha”, acervo de Lúcia Dummar.


                       O POVO: 85 anos presente no Ceará II

Raymundo Netto especial para O POVO

“O jornal é como o vinho: quanto mais velho, melhor e mais generoso.
O POVO não pode ocultar o prazer de seus redatores, neste dia de seu primeiro aniversário.
Quando ele tiver uma centena de anos... Está bem.
Mas isto fica para os nossos netos, para os tempos ditosos, quando
houver crescido a árvore que nós plantamos...”

 (Demócrito Rocha, em 7 de janeiro de 1929, no editorial que celebrava o primeiro ano de O POVO)

Demócrito Rocha nasceu baiano de Caravelas, aos 14 de abril de 1888. Perdeu os pais, João e Maria da Glória — o pai, aos dois; a mãe, aos cinco anos —, sendo ele e o único irmão, Heráclito, criados pela avó Ana numa família de poucos recursos. Menino, aos 12 anos, trabalhava de torneiro na oficina da estrada de ferro, 9 horas por dia, folga nos domingos. Aos 19 anos, moraria em Aracaju, onde uma tia lhe oferecia melhores condições — estudou no Ateneu Sergipano e no Colégio Americano. Três anos mais tarde, ingressaria na Escola de Odontologia. Devido à condição financeira, e passando em concurso público para telegrafista, largou a Faculdade e transferiu-se para Fortaleza, em 1º de fevereiro de 1912 (1), indo morar numa pensão. No Passeio Público viu, pela primeira vez, Creusa do Carmo (9 anos mais jovem) e, seis meses depois, em 9 de fevereiro de 1915, casaram-se. Em agosto, em plena famigerada seca, o casal se dirigiu ao Iguatu, retornando a Fortaleza durante gravidez de Creusa. Maria Albanisa, a primeira filha — futura Sra. Paulo Sarasate —, nasceu em 1916, e, em 1917, de sete meses, Maria Lúcia, a caçula — que após a morte do pai casaria com João Dummar, o pioneiro do rádio no Ceará. Em 1921, após longo hiato, concluiu Odontologia, na 2ª turma do Ceará, assumindo, já no ano seguinte, disciplina na Faculdade de Farmácia e Odontologia. Em 1922 sofreria sua primeira grande perseguição política, sendo acudido pelo Arcebispo D. Manoel e Antônio Sales.
Mesmo atuando como dentista em seu consultório, professor na Faculdade e telegrafista para os Correios e Telégrafos, Demócrito era irrequieto, e em 1924, após ouvir Otacílio de Azevedo e Orlando Luna Freire, iniciou a publicação da revista Ceará Ilustrado. Segundo Otacílio (2), “Demócrito sacrificava parte da verba auferida com o seu trabalho no consultório e aplicava-o, com a maior boa vontade, na revista. Era de vê-lo, então, feliz, [ele próprio] fazendo a distribuição da revista nos quiosques da praça do Ferreira”. Foi na Ceará... que ele criou o concurso de escolha do “Príncipe dos Poetas Cearenses”, no qual foi eleito o Padre Antônio Tomaz.
No ano seguinte, Matos Ibiapina fundou o jornal O Ceará, opositor do governo, e convidou Demócrito como Diretor Literário, sendo frequente colaborador com a coluna “Nota do Dia”, na qual assinava “DR”. Neste ano, torna-se um dos fundadores da Associação Cearense de Imprensa, a ACI. Na época, mantinha seu gabinete dentário, mas montou outro, próximo à igreja do Patrocínio, exclusivamente para atender aos mais pobres.
Em março de 1927 fundou o Partido da Mocidade, juntamente com Jáder de Carvalho, Plácido Castelo, Alfeu Aboim, dentre outros, onde combatia ao latifúndio e exigia a fiscalização das eleições, a moralização do voto e a arregimentação dos operários em forte núcleo eleitoral, dentre outros princípios. Em junho do mesmo ano, após ameaças constantes e perseguições denunciadas em O Ceará, é espancado barbaramente por doze policiais em praça pública, promovendo uma onda de protestos por toda cidade, recebendo apoio da imprensa brasileira.
Em 7 de janeiro de 1928 fundaria O POVO, “o jornal das multidões”. Em agosto, Demócrito, que era simpatizante de Prestes, manifestou-se abertamente, no Theatro José de Alencar, contra o presidente Moreirinha, comparando-o a um mucuim (um inseto cuja picada causa dor e coceiras), durante a visita da Caravana Democrática de Assis Brasil (3).
Em 1929, O POVO lançou a revista Maracajá, veículo de elevada importância na inauguração e promoção do Modernismo do Ceará. Também em ‘29, um grande risco para economia mundial e, por consequência, para a empresa O POVO: o “crack” da Bolsa de Valores de Nova York. Mas, ao contrário do que muitos esperavam (outros, incomodados, torciam), o jornal cresceu ainda mais, adquirindo moderno equipamento da Alemanha e mudando-se, no ano seguinte, para novo prédio, na Major Facundo.
Em 1930, ano em que, considerado “subversivo”, se refugiou em esconderijo onde se comunicava com o resto do país por meio de código Morse, ingressou na Academia Cearense de Letras. Após a vitória do movimento de 30, foi convidado para assumir cargo no governo, o que recusou. Quatro anos mais tarde, elegeu-se deputado federal. Transferiu-se para a capital brasileira, o Rio de Janeiro, de onde enviava manuscrita a coluna “Ceará... de Longe”, na qual defendia a modernização do estado e a fiscalização do uso dos recursos públicos. Em 1937, veio de férias ao Ceará. Está enfermo e descobre a causa: tuberculose. Mesmo assim, retorna ao Rio. Porém, Getúlio Vargas fechou o Congresso, o que o fez voltar, definitivamente, ao Ceará, quando passou a criticar a Ditadura Vargas — O POVO teve suas matérias censuradas inúmeras vezes, em parte ou na íntegra — e a combater o avanço dos ideais integralistas. Mudou-se de casa mais uma vez, a última, e passou a residir na “casa do cajueiro torto”, na Gentilândia.
Em 1943, no mesmo ano em que tomou posse no Instituto do Ceará; em que comemorava o progresso e crescimento de O POVO — em seus 15 anos — e a leitura de algumas de suas crônicas sobre a Segunda Grande Guerra pela BBC de Londres, foi em 29 de novembro, às 18h, que a doença lhe tomou o ar para sempre.
Demócrito tinha alma de poeta de “chamejante pena”(4), tão liberto e desprendido, que, mesmo com todas as funções que atendeu em vida, com todo prestígio que dela gozou, nunca preocupou-se em ter uma casa própria ou sequer publicar único livro. Sabia reconhecer a inteligência e o talento, promovia-os, criava, exalava ideias, homem de multidões, fiel aos amigos, democrático — a ponto de saudar o surgimento de jornais concorrentes —, quem sabe um dos pioneiros do marketing cearense, maior promotor da interação leitor-jornal.
Um dia, em 1934, Assis Chateubriand propôs negócio: compraria O POVO. Demócrito respondeu com a pergunta: “Venderia um filho?” Diante da negativa de Chatô, sorriu e disse: “Eu também não. O POVO é meu filho!” (5) Atitude poética pura. E é desse Demócrito Rocha, o poeta, o boêmio, o construtor de sonhos que falaremos mais daqui a 15 dias.

1. Afirmação do próprio Demócrito, publicada por Paulo Sarasate. Edmar Morel (10.9.12) e Padre Misael Gomes (01.09.12) conflitam sobre a verdadeira data.
2. Otacílio de Azevedo em Fortaleza Descalça, 3ª ed. Fortaleza, SECULT, 2011.
3. Daniel Carneiro Job em Praça do Ferreira, 2ª ed, 1992.
4. Raimundo Girão em Fortaleza e a Crônica Histórica, Ed. UFC, 2000.
5. Adísia Sá, em Traços de União, EDR, 1999.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013





                                                          PANELINHAS

Crônica de Pedro Salgueiro para O povo.

Quase todos nós temos (ou tivemos), desde criança, nossas inevitáveis e fundamentais “panelinhas”.

Primeiro, pra mim, veio a “patota” da escola, seguimos juntos até a oitava série, com raras baixas, uns poucos repetiram o ano, outros mudaram de cidade. Ainda hoje quando nos vemos o coração bate mais forte, saudoso...

Depois veio a “turminha” do futebol, amigos antigos que dividiam sonhos e pelotas. Quase nunca os vejo, empurrados que foram para o “Sul” em busca da sobrevivência. Enorme também é a alegria nos raríssimos reencontros. Vez em quando sonho jogando com eles, os mesmos anseios, as mesmas emoções. Geralmente acordo triste, um vazio fundo cala no peito.

Na cidade grande as “cambadas” se sucedem com rapidez: veloz que a vida é por aqui. Fugazes se foram os amigos do Colégio São João, da Agronomia, da História e da Pedagogia. De quando em vez ainda encontro alguns até do tempo da residência estudantil Réu 125, ali da Paulino Nogueira, na testa da Praça da Gentilândia. Lá aprendi o equivalente a duas faculdades e meia, ou mais, na antiqüíssima escola da vida.

Hoje já coroa, barriguinha proeminente, cabelos poucos e grisalhos, não perdi a mania de “corriolas”, qualquer motivo é válido para reencontrar os novos e velhos amigos. Uma vez por mês algum de nós convoca o restante com um e-mail desabusado, não raro cheio de pilhérias e grosserias. São os malfadados “Poetas de Quinta”, que começaram a se reunir no Assis da Gentilândia às quintas-feiras e, devido ao barulho ensurdecedor do referido bar, hoje vivem a migrar de bodega em bodega.

Alguns levam livros para trocas, verdade que alguns tão ruins que sobram para os garçons. Fala-se um pouco mais sério no início, mas depois se caminha inevitavelmente para as amenidades.
Na turma boa não há preconceito de credo, time ou cor (muito embora sejam raríssimos os alvinegros ou fumantes). Não é fechada, muito pelo contrário, está sempre aberta a novos penetras. A variação de pensamentos e ações é notória: mas todos bebem ou dizem alguma coisa nociva. A gozação chega às raias do quase intolerável. Vez em quando os “meninos crescidos”, para não dizer “quase murchos”, perdem a composturas e saem da linha. Depois da terceira ou quarta cerveja desatam a querer discutir sobre tudo o que é inutilidade pública ou privada.

Nada sério, felizmente, mas algumas rusgas ainda resistem ao tempo e ao perdão. Nenhum dos velhotes se trata pelo nome verdadeiro: pulula uma variedade de apelidos infames, mas geralmente pertinazes com (ou “ao”) o temperamento ou o tipo físico do agraciado.

Uns morrem de raiva, até o próximo encontro quando poderão enfim se vingar.

— Tu lá entende de Maçonaria.
— Entendo, sim, muito mais que você.
— Deixa de ser ignorante!...

Alguém toma partido só pra atiçar os litigantes. Logo mudam de assunto e daqui a pouco já estão falando besteira a respeito de outro assunto.

***

Sei que vou (se não morrer antes, claro) ficar velhinho procurando amigos para encontrar e conversar besteiras, seja no alambrado do PV, no “Banco do Pau-Duro” da Praça do Ferreira, no sofá da Livraria Arte & Cultura, ou num boteco qualquer dessa imensa e sonsa loirinha desmilinguida pelo sol.