quarta-feira, 24 de julho de 2013

ENSINO DE LITERATURA CEARENSE



BATISTA DE LIMA
Caderno 3 Diário do Nordeste
23.07.2013


Desde quando ingressei no ensino universitário que, entre as disciplinas que tenho ministrado, está presente a Literatura Cearense. Essa experiência tem me proporcionado algumas conclusões que devem interessar a quem faz Literatura no Ceará. É importante saber o nível de leitura dos nossos universitários, o gênero literário de suas preferências e os autores mais lidos. Essas revelações podem melindrar alguns autores que não são lidos e ao mesmo tempo impressionar positivamente aqueles que se acham esquecidos por não saberem que são apreciados. Há muitas curiosidades sobre o assunto.

O aluno de Literatura Cearense, geralmente, inicia a disciplina conhecendo algumas informações sobre José de Alencar e Rachel de Queiroz. Quando muito, leram algum livro desses dois autores, obrigados pelo professor do ensino médio. Raro é aquele que tenha lido algo a mais. Suas leituras são, vez por outra, a página esportiva ou policial de algum jornal. Revistas, só esporadicamente, de preferência as que trazem fofocas com artistas. Quando o vestibular exige a leitura de um livro, ou de livros, alguns os leem, mas a maioria procura ler a sinopse apresentada pelos cursinhos. Fato é que nossos alunos saem do ensino médio sem o hábito de ler.

Aqueles raros que possuem alguma leitura têm uma preferência maior pelo conto. Eles não gostam de ler livros de poemas e consideram os romances muito maçantes. O gosto pelo conto é decorrente do lado mais digerível desse gênero literário. É uma narrativa curta e independente, numa coletânea, o que possibilita um intervalo após cada texto. Com o transcorrer da disciplina, eles adquirem um certo gosto pelas histórias curtas de Moreira Campos, Pedro Salgueiro, Nilto Maciel, Tércia Montenegro e Thereza Leite.

Quando partimos para a leitura de poemas, mesmo com muitas dificuldades, há os que preferem Alcides Pinto, Francisco Carvalho e Luciano Maia. Dos mais antigos, há um certo gosto pelos sonetos da Padre Antônio Tomás, por Juvenal Galeno e Artur Eduardo Benevides. Vez por outra aparecem leituras de Cândido Rolim, do Poeta de Meia Tigela e de Mário Gomes. Essas leituras são feitas espontaneamente pois nunca indiquei determinado livro. Apenas solicitava que eles procurassem nas bibliotecas e livrarias um autor cearense para leitura.

Certa feita, uma equipe teve a ideia de fazer uma enquete entre cem intelectuais cearenses para saber qual o poema de nossa literatura que cada um mais apreciava. Como resultado final, o poema "Terra Bárbara", de Jáder de Carvalho, ficou em primeiro lugar. O segundo ficou com "Ode à Língua Portuguesa", de José Albano. "Ode Visionária", de Francisco Carvalho, ficou com o terceiro lugar. O quarto coube ao Padre Antônio Tomás, com seu soneto "Verso e reverso". O quinto lugar ficou com "Rio Jaguaribe", de Demócrito Rocha.

Esse exercício é quase uma brincadeira mas levou a equipe a conhecer os intelectuais e principalmente ler os textos apontados pelos entrevistados. Afinal, Literatura Cearense não é apenas estudo de sala de aula. É também trabalho de campo. É preciso participar de alguns lançamentos de livros, palestras, debates e assistir a alguns documentários sobre os principais autores. A TV Assembleia possui um acervo de vídeos já considerável sobre autores cearenses que são de grande valia. Até um levantamento das ruas literárias de Fortaleza foi feito nesse período e nos surpreendeu.
Foi constatado que Fortaleza já possui mais de quatro mil ruas, quase todas com nomes de pessoas conhecidas ou não. Entre todas, há sessenta e seis com nome de escritores cearenses. São sessenta homens e seis mulheres. Na época da pesquisa em que Rachel de Queiroz, Natércia Campos e Moreira Campos já haviam falecido, não havia rua com seus nomes, enquanto há logradouros com nomes que ninguém sabe a origem. O autor cearense mais contemplado com nomes públicos é José de Alencar, em todo o Ceará.

Outra promoção feita com esses alunos de Letras era a realização de uma visita ao Palácio da Luz, na Praça dos Leões. É que ali funciona a Academia Cearense de Letras e serve também para reuniões de quase duas dezenas de outras academias. Ali os estudantes de Letras em qualquer época podem conhecer a galeria de retratos dos acadêmicos e tomar conhecimento da história daquele vetusto prédio em que o Governo Estadual estabeleceu sua sede por mais de cento e cinquenta anos. A história cearense passa por aquele palácio.

Agora que me aposentei como professor da universidade Estadual do Ceará, essa disciplina passará para outro professor. Além disso, na Universidade de Fortaleza, ministro outras disciplinas. Assim sendo, vou continuar lendo essa rica literatura e pesquisando sobre seus principais autores e livros. Além disso acompanhei o desempenho profissional daqueles que compartilham saberes comigo. Já vejo alguns escritores que foram meus alunos, como Carlos Vasconcelos, Saulo Lemos, Edmar Freitas, Angélica Sampaio, Nádia Gurgel e outros. Assim, posso afirmar que depois de tantos anos envolvido com nossa literatura, constatei que é inesgotável a Literatura Cearense

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