segunda-feira, 4 de julho de 2011


                          “Ô de casa”
                          “Ô de fora” 

As residências estão habitadas de medos.
As câmeras de segurança desconfiam de qualquer pessoa. Alarmes estão prontos para delatarem assaltos. As guaritas blindadas procuram suspeitos. Cingindo a residência, cercas elétricas armazenam o choque fatal. O interfone não permite olharmos a cor dos olhos da irritada voz feminina perguntando: o que é? Cães pit bull latem apetitosos por ataques mutiladores.
Os extensos muros de pedra dos luxuosos condomínios residenciais difundem a rusticidade dos castelos medievais, que protegiam seus moradores dos povos invasores. Nesses condomínios - será que eles já possuem passagens subterrâneas? - cada inquilino soma às suas necessidades de defesa, outros equipamentos de segurança: portas e janelas gradeadas, assemelhando-se a celas prisionais.
Vizinhos não conversam mais. As cadeiras que pertenciam às calçadas embalando as conversas de boca de noite, hoje são imoladas pela TV.
As ruas estão habitadas de ausência de crianças. Tanta coisa a fazer. Tanta conversa. Tanta novidade. Elas não brincam mais de bila, de triângulo, de peteca. Não existem mais as rodas de meninos trocando figurinhas de álbuns. Todos estão nos majestosos condomínios, algemando-se ao computador.       
As residências de hoje são solitárias, lado a lado.
Sempre inventamos novas maneiras de errar.
Lastimável o ontem não ser para sempre. Casas de portas abertas aos ventos. Janelas escancaradas acolhendo a luz da alvorada. Muretas permitindo olhares para as azaléias, buganvílias e violetas nos jardins. Liberdade! Assim eram as casas da minha infância. Quando alguém chegava, batia palmas, se anunciando: “Ô de casa”. Da cozinha cheirosa de temperos, vinha a resposta: “Ô de fora”.
Mesmo não sabendo quem era. 

Silas Falcão

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