Che, o duplo
Ernesto Guevara [dizem] nunca teria se tornado Che se
[em certa noite de nuvens negras de 3 de setembro de 1946] não tivesse dobrado
à direita em um beco sem nome a 50 metros da Calle Corrientes.
Ao dobrar, encontrou [segundo os dois únicos relatos a respeito, ambos
(previsivelmente) de videntes] uma garota [de brincos vermelhos e obviamente
belíssima] que levou o [desengonçado] ginasiano a passear por uma tranquila
Buenos Aires.
O Obelisco lembrou a ela do sacrifício do profeta da Judeia [segundo
ela, tão portentoso quanto inútil]: os perigos do Excesso de Retidão [disse
com seriedade mais sedutora que um sorriso]. Caminharam [ela virava o rosto ao
passarem por um solitário mendigo] com carinho e tristeza mais
profundos que a Aurora Austral – essa péssima figura de linguagem ele
a escreveu no único poema que dedicou a ela.
E sua imaginação [já ligada à dela] lhe revelou: casariam; teriam sete
filhos [nos tempos antes da pílula]; preocupações e êxtase se seguiram – e a
morte, em algum hospital em La Plata – não tantas décadas depois assim. Os
pobres não teriam seu herói – e não lhes faria falta.
Se tivesse dobrado à esquerda – mas dobrou à direita. A garota ficou a
dez metros [o suficiente para nunca se conhecerem]. Ele viu um homem pobre [e
não virou o rosto] – e o resto acabou na Sierra Maestra.
Explicam que a garota era na verdade aquele, de rabo e
chifres, disfarçado – explicação esta que nunca teve força pois o próprio Che,
ateu renitente, nela nunca acreditaria.
Esse e outros no Blog Paulo Avelino – Escritos.
Abraços,
Paulo Avelino
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