Coisas Engraçadas de Não se Rir X: Tá Todo Mundo doido... Oba!
Mas do jeito que as coisas andam no mundo, só não corre o risco de ficar doido aquele que já está. Estresse, ambição, egoísmo, falsidade, mentira e incompreensão. Somem-se a isso tudo a solidão, o medo e a maldade. A maior loucura é aceitar tudo isso e não ousar seguir em frente, a seu modo, traçando uma vida única e original, sem medos de ser taxado de maluco. A realidade confirma, como escrevi certa vez: “só os egoístas serão felizes!”
Anos-há, tive passagem pelo Hospital Mental, não como interno — fique bem claro —, mas como terapeuta. Alguns poucos meses dos quais não mais me esqueci (nem me recuperei).
A princípio, curiosidade: observar àquelas pessoas, alienadas, delirantes ou alucinadas, frágeis de pensamentos, coloridas por angústias e histórias insonháveis. Depois: o medo. Medo deles? Não, medo de mim! Imaginar que tão absurdo estado poderia tomar-me de assalto de uma hora a outra, sem bater à porta, partindo de a mais inocente esquisitice, “neura”, excentricidade até margear o desvario absoluto, amedronta. Pus-me, dês então, a reconhecer a loucura do outro na minha, um exercício interessante e, por vezes, engraçado.
Por mim, já naqueles tempos, daria alta a um bocado de gente ali, muitos deles bem parecidos com amigos e pessoas queridas aqui de fora, “normais” em suas manias e paranóias e até com um discurso mais organizado e convincente — a literatura, por exemplo, é um celeiro de gente normal. Não via nada demais neles, mas a equipe, diante de minhas argumentações imaturas, assegurava: “Esse aí? Ihhhh, é doidinho da silva...”
Dentre os tipos: o catatônico, feito estátua, parado no pátio; a mulher ao chão a chorar agonias de saudades de uma mãe que não existia; um “rapaz-gato” que miava na orelha das internas; a velhinha em olhar fixo a trazer ao colo uma boneca; um que, de lençol ao pescoço feito “capa”, galopava numa vassoura o dia inteiro levando e trazendo recados; o “poeta” que andava com livros, em espanhol, debaixo do braço e um caderno na mão, sempre explicando sobre “las musas”; enfim, uma ruma de personagens fantásticos, todos devidamente registrados como “doidos oficiais”.
Na emergência, por trás de grades, pacientes pelados — para não usarem peças de roupas como “forca”. Fora delas, outros, entupidos de remédios, andavam em círculos, feitos múmias. Um deles, lembro, com dois dedos em “tesoura”, espetava os olhos dos colegas. Alguém, com ainda alguma sensibilidade, reclamava: “Tu é doido? Quer furar meu olho, seu doido?” O “engraçadinho” saía com passos atropelados e maneando a cabeça: “Sou doido não, macho, sou doido não...”
Havia um velhinho, o Valmir Vapy, nem parecia doente. Era de bulir nas pacientes jovens ou dedilhava o dia em seu violão, isso, enquanto não confeccionava, de próprio punho, o jornalzinho “A Verdade”, informativo que tinha de um tudo: anedotas, atualidades, gastronomia, efemérides e fofocas do manicômio, e que lhe garantia, por meio de “assinaturas”, o trocado do cigarro. Da minha turma, apenas eu o assinava e ele, bom jornalista, cumpria suas edições regularmente. Noutro dia, surpreendeu-me a manchete da primeira página: “Netto, Fisio, é líder da equipe dos babões!”. Indignei-me: “Ô, Valmir, você é doido? Quer perder o assinante, rapaz?” Soube depois, ser ele apaixonado pela minha professora, e estando eu sempre muito próximo a ela, ficara doido de ciúmes.
Mas a loucura é original. Num hospital, todos os meses, elegiam três pacientes para uma entrevista de alta. O médico orientava: faria uma pergunta bem simples a cada um dos três. Respondesse direitinho: alta! Perguntou ao primeiro: “Fulano, quanto é dois mais dois?”. Respondeu: “69!”. Reprovado na lata! Ao segundo: “Cicrano, quanto é dois mais dois?”. Ele: “Terça-feeeira!”. Coitado... Insistiu no terceiro: “Beltrano, quando é dois mais dois?”. Finalmente: “Quatro!” “Muito bem, até que enfim alguém merece receber a alta... Pode nos dizer como chegou à conclusão”, indaga. “Muito fácil, doutor, só prestei atenção nas respostas dos colegas... Olha só: 69 menos terça-feira é igual a quatro!” Ô lôco!
Raymundo Netto para O Povo
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