quarta-feira, 29 de junho de 2011

                                          A pasta azul

A chuva espalha um vento frio. Em segundos, os relâmpagos clareiam fragmentos da escuridão.
Ligo os faróis. De repente um vulto acena. Paro o carro no acostamento.
– Boa noite.
– Boa noite, respondo.
– O senhor pode me dar uma carona até o cruzamento?
Desconfiado, olho o estranho vestindo uma capa branca. De qual ermo desta BR ele surgiu? Arrisco a carona.
– Pode entrar.
– Obrigado.
– De onde o senhor vem?
– De um atendimento.
Observo a sua pasta e o seu olhar de quem abstrai memórias.
Percorro quilômetros, acompanhado do seu mutismo. O olhar imóvel continua.
– Desço aqui.
– O senhor está bem?
– Estou.
– Qual o seu nome?
– Enzo Flores. Muito obrigado pela carona.
Assim como surgiu, ele some no cruzamento.
A chuva se desgruda da terra.
Sob a florescência das lâmpadas iluminando a madrugada, procuro o número da casa da minha irmã.
Ela abre a porta com um sorriso que eu não contemplava há vários anos.
Saboreando uma xícara de chocolate quente, falo-lhe da viagem.
– Dei carona a uma pessoa estranha.
– Quem era?
– Um senhor alto, forte, uns 70 anos. Cabelos grisalhos. A voz grave e hospitaleira.
– Qual o nome dele?
– Enzo Flores.
Graussá sentiu seu coração disparar e os joelhos tremerem.
– Meu irmão, você tem certeza que o nome dele é esse?
–Lógico. Fiquei muito atento quando ele falou.
– Mas...                                                                              
– O que foi?
– Esse senhor era médico nesta cidade e percorria a região fazendo atendimentos gratuitos. Ele morreu faz anos!
 
Silas Falcão

    

Um comentário:

franmello disse...

QUE BELO SILAS ,ME PARECE UM CONTO REAL,E O É?!
CURIOSAMENTE TU ESCREVEU ESTE CONTO NO DIA DO MEU ANIVESÁRIO.E CURIOSAMENTE TB EU LHE MANDEI UM EMAILL NO PERÍODO EM QUE O YUIRI IA VIAJAR E EU NÃO SABIA,APENAS SENTI UMA FORTE SAUDADE DE TEUS ESCRITOS.DEUS SABE O QUE FAZ.ABRAÇOS/FRANMELLO

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